Serra quer mudar acordo da dívida de São Paulo

09/01/2009

O prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), tentará mudar o acordo da dívida consolidada da cidade, hoje com o estoque de R$ 31 bilhões. Pelo menos dois pontos serão alvo de negociação: o limite de enquadramento, que obriga a prefeitura a reduzir a relação dívida/receita a 1,7 até maio deste ano, e 1,2 até 2016; e o uso do IGP-DI como indexador das parcelas da dívida. Atualmente, a cidade está com uma dívida consolidada que supera cerca de 2,4 vezes a receita.

A troca do IGP-DI por outro indexador – o IPCA foi citado pelo secretário municipal de Finanças, Mauro Ricardo Machado Costa, como um bom índice – deteria a elevação do estoque, mas não resolveria o problema imediato. Para estar enquadrada, a cidade teria que desembolsar de R$ 8 bilhões a R$ 9 bilhões dentro de três meses, ou mais da metade de seu Orçamento de cerca de R$ 15 bilhões. Por isso, segundo Mauro Ricardo, a futura proposta poderá sugerir simplesmente o fim do limite para enquadramento.

“Já existem outras restrições para o aumento do endividamento do setor público”, argumentou. O secretário não quis adiantar se a prefeitura poderia pedir ressarcimento da diferença que teria sido paga a mais no período de vigência do contrato, caso o indexador seja trocado. Pelos cálculos da prefeitura, o total a mais seria da ordem de R$ 4 bilhões.

Nas próximas semanas, Serra irá acelerar as conversas com governadores e outros prefeitos de capital para colocar em discussão uma proposta única. “O município de São Paulo não é o único ente da Federação fora do enquadramento”, afirmou o secretário. Além da prefeitura, o próprio governo estadual está fora do limite. O governo municipal também deve procurar os governadores de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Alagoas, entre outros.

Se os governos municipais e estaduais fora do limite não se enquadrarem, terão como punição o corte de transferências voluntárias do Orçamento e perderão o aval do Tesouro Nacional em operações de crédito. Na opinião de Mauro Ricardo, a inadimplência poderia repercutir de forma negativa no mercado financeiro internacional, aumentando o risco-país. Esta possibilidade sensibilizaria o governo federal para uma posição negociadora.

No final do ano passado, com apoio do Ministério da Fazenda, a então prefeita Marta Suplicy propôs o adiamento por um ano do prazo para o enquadramento. Esta proposta não interessa ao governo municipal atual. “Jogar o problema para frente não resolve”, resume Mauro Ricardo.

A dívida consolidada é parte do enorme rombo que a nova administração tenta gerir. Segundo Mauro Ricardo, os compromissos financeiros já vencidos ou que vencem este ano atingem R$ 16 bilhões. Deste total, cerca de R$ 2 bilhões referem-se a dívidas de curto prazo deixadas pela administração anterior e R$ 3,3 bilhões a precatórios. O déficit previdenciário representa R$ 1,5 bilhão ao ano.

Para diminuir o peso desta última conta, Serra enviará nos próximos dias para a Câmara dos Vereadores um projeto de lei aumentando a cobrança previdenciária para ativos e inativos de 5% para uma alíquota mínima de 11%. Na avaliação do secretário, isso representará um ingresso de recursos da ordem de R$ 1 bilhão ao ano, insuficientes para cobrir a necessidade de financiamento ou minorar o déficit atuarial da previdência paulistana, que é de R$ 48 bilhões. Hoje a prefeitura cobra 5% de seus servidores, para o financiamento das pensões.

“A prefeitura terá que continuar complementando o sistema previdenciário com recursos do tesouro municipal para sempre”, afirmou. De acordo com Mauro Ricardo, não há muitas outras possibilidades de aumentar a receita da prefeitura. Uma possibilidade é propor um encontro de contas com o governo federal com o saldo do Fundo de Compensação por Valorização Salarial (FCVS).

Segundo o secretário, a Cohab paulistana seria credora de R$ 1 bilhão devidos pelo Tesouro Nacional. Outra medida será rever a planta básica dos imóveis, usada para cálculo do IPTU. O governo municipal não deverá alterar a política de isenções adotada pela administração passada.

Pelo lado da despesa, a secretaria prepara a renegociação dos contratos dos serviços e licitações em curso. Até 31 de março, o governo municipal terminará a análise dos contratos e irá propor uma renegociação dos valores. No início do governo Marta Suplicy, o então secretário de Finanças, João Sayad, fez um enorme cancelamento de empenhos no Orçamento, dentro dos restos a pagar inscritos pelo prefeito anterior, Celso Pitta. A partir daí, impôs um desconto no valor global e um parcelamento em quatro vezes.

“O Sayad fez uma ação com base nos empenhos de serviços já prestados. Ele trabalhou o passado. Nós vamos trabalhar o presente e o passado. Isto vai pegar tudo. Só nos contratos de linhas de ônibus, são R$ 2 bilhões por ano”, disse o secretário. Nos novos contratos, deve prevalecer a orientação de dividir a prestação de serviços em vários lotes, de modo a aumentar a competição entre os grupos empresariais.

A longo prazo, o secretário disse que o prefeito deverá estruturar as parcerias com o governo estadual. Ex-presidente da Copasa, a empresa de saneamento de Minas Gerais, Mauro Ricardo afirmou que Serra defende uma gestão compartilhada de água e esgoto no município, com a Sabesp. O governo municipal proporia participar dos investimentos e em troca, pleitearia uma parte das receitas da empresa, com o argumento de que o município responde por 60% da arrecadação total da Sabesp.

Valor Online
César Felício De São Paulo
4/2/2005