‘Se fora está ruim, invistam dinheiro aqui’
09/01/2009
7 de Fevereiro de 2008 – Apesar da decisão política já ter sido tomada, o governo ainda estuda como tirará do papel o trem-bala que ligará São Paulo ao Rio de Janeiro. Em entrevista a este jornal, o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, conta quais são as etapas a serem percorridas pelo Executivo para realizar a licitação da obra no ano que vem. Rebate as críticas ao projeto, e vaticina: “Será a maior contribuição do governo em termos de infra-estrutura de transporte de passageiros”.
Nascimento também revela quais serão as suas próximas ações. Ele decidirá qual será o destino da presidência da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Os partidos da base aliada brigam para fazer a indicação. José Alexandre Resende, o atual presidente, é o último dirigente de agência reguladora em exercício nomeado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A outra missão do ministro é concluir a redação da medida provisória que promoverá a integração da malha de bitola larga das ferrovias do País.
Gazeta Mercantil – A novidade do ano no setor foi a inclusão do trem-bala no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Segundo o projeto, 32,5 milhões de pessoas usarão o veículo e a passagem será de aproximadamente US$ 60. Há contestação sobre a viabilidade do projeto e sobre a demanda. O senhor concorda?
Cada um sai com uma tese diferente, mas o fato é que não temos especialistas sobre isso no Brasil. Qualquer coisa que se fale sobre o trem-bala é chute, até porque o País não tem experiência nesse tipo de transporte. O que nós temos de fato é um estudo de viabilidade econômica, um projeto executivo da obra e um projeto ambiental, feitos por um grupo italiano (Italplan). O governo não pode adotar a tecnologia italiana, mas pode adotar essas informações para chegar a um caminho para realizar uma licitação em que todas as tecnologias participem.
Gazeta Mercantil – O governo já decidiu se será uma concessão à iniciativa privada ou terá de entrar com dinheiro para tirar a obra do papel?
Na versão dos italianos, seria concessão. O Ministério dos Transportes e o Tribunal de Contas da União analisaram o projeto. Aparentemente, há a viabilidade para fazer a concessão. Como o governo resolveu que quer a obra feita, contratou uma consultoria internacional por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Em agosto, o estudo de viabilidade econômica será concluído. Aí sim se poderá falar sobre as perspectivas desse projeto, se ele será totalmente concessão ou se com a inclusão do trecho entre São Paulo e Campinas precisará ter a participação do governo. Só com a conclusão dos estudos o governo vai ver qual caminho seguirá.
Gazeta Mercantil – A projeção de demanda é realista?
Estudos mostram que, se for a metade da demanda que está ali, há viabilidade. Se for um pouco menos, o governo teria que ter participação financeira. Ou ainda poderia não cobrar outorga ou energia, por exemplo. Isso aconteceu com a concessão de rodovias.
Gazeta Mercantil – O senhor trabalha com que cronograma?
A expectativa é de ainda no primeiro semestre do ano que vem fazer o leilão para a realização da obra. O que a gente tem ainda é muito vago. Mas, chama a atenção o fato de muitas empresas se interessarem por isso.
Gazeta Mercantil – E se o estudo mostrar que há a necessidade de o governo entrar com dinheiro e realizar uma Parceria Público-Privada (PPP)?
No entendimento do governo, vale a pena. Primeiro, esse é um transporte que contribuirá para resolver o problema dos meios já existentes. O transporte aéreo, por exemplo, vai ter a vida facilitada. A viagem entre Rio e São Paulo de avião dura mais ou menos 50 minutos. A viagem de trem será de um pouco mais de uma hora, com preço bem menor. Será mais uma opção.
Gazeta Mercantil – O senhor não espera resistências das companhias aéreas?
Há tantos passageiros que eles não estão conseguindo atender. Isso é modernidade. Só aqueles mais arcaicos ou que se sentirem prejudicados é que vão reclamar. O governo tem hoje a certeza de que o projeto é viável e que é importante para o País. A maior contribuição em termos de infra-estrutura de transporte de passageiros do governo será esse trem.
Gazeta Mercantil – O trem ficará pronto para a Copa do Mundo de 2014, que será no Brasil?
O projeto dos italianos prevê a construção em cinco anos. Se a obra começar em 2010, não ficará.
Gazeta Mercantil – O País está preparada para o aumento da demanda que ocorrerá durante a Copa?
Precisa de algumas adaptações, como o transporte coletivo no Rio e sistemas de metrô. São coisas localizadas. É mais infra-estrutura urbana. O País vai ter que fazer investimentos nas cidades. Tivemos picos de problemas no sistema aéreo, mas com as providências que estão sendo adotadas isso será equacionado.
Gazeta Mercantil – O governo pretende realizar em breve uma nova etapa do programa de concessões de rodovias. Na última, os espanhóis foram os grandes vencedores. Agora, com a crise financeira internacional, o interesse dos estrangeiros continuará?
Acho que sim. A nossa realidade hoje é outra. Se lá está ruim para investir, que tragam o dinheiro para cá, porque aqui está melhor. Eu não tenho muita preocupação em relação a esses investimentos. O investidor é um profissional do risco. Mesmo na crise, o dinheiro que circula pelo mundo terá de ser investido em algum lugar.
Gazeta Mercantil – Com a extinção da CPMF, o governo terá de reduzir despesas. O senhor já conversou com o presidente Lula e com os integrantes da Comissão de Orçamento do Congresso para saber onde é que a sua pasta vai cortar?
A definição do governo é não mexer no PAC, e no nosso ministério é quase tudo PAC. De R$ 10 bilhões de investimentos, R$ 8 bilhões são do PAC. Há aproximadamente R$ 1,5 bilhão de custeio, onde a gente pode reduzir alguma coisa.
Gazeta Mercantil – Qual é a principal prioridade do seu ministério neste ano?As ferrovias. Com uma medida provisória, criaremos a integração da malha de bitola larga do País por meio de concessões. Integraremos Sudeste, Norte e Nordeste por ferrovia, integrando isso também ao Centro-Oeste. No Sul, expandiremos a bitola métrica. Tudo isso por meio de concessões. Assim, os centros produtores terão outra opção de acesso aos portos.
Gazeta Mercantil – A previsão do governo é assinar os contratos das concessões das rodovias licitadas no ano passado dia 11. Até lá, o governo conseguirá derrubar todas liminares tempo?
A gente vai resolver.
Gazeta Mercantil – Se atrasar, o governo vai garantir a manutenção enquanto as concessionárias não assumirem as rodovias? Haverá um vácuo de investimentos em manutenção?
Não. O governo tomou o cuidado de ter contratos de manutenção nessas estradas até que a iniciativa privada cuide.
Gazeta Mercantil – O senhor já decidiu quem será o próximo presidente da ANTT?
Qualquer que seja o nome só será encaminhado por mim ao presidente Lula se for alguém da área, até porque estamos em um processo volumoso de concessões. A indicação pode até ser política, desde que tenha esse pré-requisito.
Fonte:
Gazeta Mercantil
Fernando Exman e Rivadavia Severo