Plano Real completa 15 anos entre vitórias e desafios

01/07/2009

Em 1º de julho de 1994, há exatos 15 anos, o Plano Real rompeu com uma sequência de pacotes econômicos fracassados e mudou não só a moeda como os rumos da economia brasileira. Economistas ouvidos pela reportagem do Último Segundo destacam a contenção da inflação desenfreada como o grande feito do plano, mas também ressaltam heranças ainda não superadas: juros altos, crescimento aquém do potencial e instabilidade quanto às turbulências externas.

fracasso de seis planos econômicos em apenas oito anos – Plano Cruzado, Cruzado II, Bresser, Verão, Collor e Collor II – compunha um cenário descrente da atuação do governo. A inflação atingia 50% ao mês, índice extremamente distante do marcado em maio passado, 0,47% de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

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Rubens Ricupero, ministro da Fazenda em 94

No mês seguinte ao início do Plano Real, as mudanças começaram a aparecer: a inflação mensal despencou para 6,84%. Em agosto de 94 o índice chegou a 1,86%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “O Plano Real marca uma nova fase da história econômica brasileira. Com maior estabilidade de preços”, diz Antônio Correia de Lacerda, professor de economia da PUC-SP e consultor econômico.

O diferencial do plano “que deu certo” frente às tentativas naufragadas foi a renegociação da dívida externa e o bom nível de reservas, segundo Lacerda. “Outro ponto importante foi o fato de não ter adotado congelamento de preços e sim uma reforma monetária, mudando a moeda para que ela resgatasse sua capacidade”, explica o economista.

Luis Roberto Troster, doutor em economia pela USP e sócio da Integral Trust, ressalta que o ajuste fiscal teve importante papel no sucesso do Real. “O aperto fiscal não aconteceu nos planos anteriores”, destaca. Lacerda avalia o Plano Real como bem sucedido e responsável por “vencer a ameaça da hiperinflação” que rondava o País.

“Armadilha cambial”

A valorização do real ante o dólar, condicionada pela pré-fixação da variação cambial, garantiu a queda dos preços, mas resultou em um problema para a economia brasileira. “Houve uma deterioração da balança comercial, porque incentivou-se as importações em detrimento das exportações”, explica Lacerda. “Sem ganhos de produtividade, uma valorização do câmbio pode acabar com a indústria nacional”, completa Troster.

A situação agravou-se em 1999, ano em que o Brasil enfrentou uma crise energética. “Tivemos uma mudança de política, a desvalorização do cambio, e a partir de então o Brasil entrou novamente em um quadro de crescimento”, analisa Lacerda.

No entanto, o economista acredita que o País continuou refém do câmbio: “O Brasil não se libertou da armadilha cambial, que vivemos até hoje. Essa armadilha é o ingresso de capitais que derrubam a taxa de câmbio e favorecem as importações. Com isso, perdemos empregos locais”.

AE
Funcionário da Casa da Moeda queima notas de cruzeiro real, a antiga divisa

Desafios

Uma das principais críticas ao Plano Real é a de que o País não registrou níveis de crescimento coerentes ao seu potencial. Troster analisa que reformas fiscal, tributária e trabalhista deveriam ter sido implementadas. “Estabilidade de preços e juros baixos é uma condição necessária para a economia crescer, mas não o suficiente. Nas outras frentes [as reformas], avançou-se muito pouco. Continuamos com uma legislação bastante obsoleta, se comparada a outros países”, afirma.

Para Lacerda, o principal desafio é tornar o real uma moeda “mais estável” e garantir um crescimento “independente” de turbulências internacionais. “O real é altamente instável, quando comparado a moedas como o euro e o dólar. Também temos como desafio uma taxa de juro menor e o crescimento sustentado”, afirma.

“O Plano Real na verdade não foi completado. Faltou desindexar a economia completamente, ou seja retirar os reajustes automáticos de preços baseados na inflação”, adverte Lacerda. Para o economista, assim como os salários, pedágios, aluguéis e tarifas deveriam ser desindexados. “Isso cria uma rigidez da inflação que é incompatível com a realidade atual e acaba perpetuando a inflação.”

Moeda forte?

Apesar de ter enfrentado pelo menos oito crises econômicas – México (95), Ásia (97-98), Rússia (99), apagão energético (1999), Argentina (2001), 11 de setembro (2001), eleição de Lula (2002) e a atual crise financeira global – os economistas não consideram que o real seja uma moeda “blindada”. “Não existe uma moeda à prova de crises. O real é mais forte do que eram as moedas anteriores, mas nem o euro pode ser considerado ‘blindado’”, afirma Troster.

Dada a instabilidade do dólar, Troster acredita na possibilidade do real ser usado em relações comerciais bilaterais (entre dois países). Lacerda já é mais reticente: “O real pode vir a ser uma moeda conversível, mas ainda estamos longe disso”.

Fonte:
Útimo Segundo
Marina Morena Costa