MP do biodiesel causa incerteza para investidor
09/01/2009
Por considerar que há um elemento de incerteza regulatória no artigo 5º da Medida Provisória nº 227, já aprovada pelo Congresso Nacional, que trata dos incentivos ao programa do biodiesel, pelo menos uma empresa de capital estrangeiro está relutando em fazer no Brasil um investimento de aproximadamente US$ 5 milhões para instalar uma planta de produção do combustível.
O biodiesel é o substituto limpo e renovável para o diesel derivado de petróleo que o governo quer que seja produzido e implantado aos poucos no país. O artigo da MP diz que “fica o Poder Executivo autorizado a fixar coeficiente para redução das alíquotas (…) o qual poderá ser alterado, a qualquer tempo, para mais ou para menos”.
Segundo o consultor carioca Sergio Maia, especializado na captação de investimentos estrangeiros, um de seus clientes (um grupo holandês cujo nome ele manteve em sigilo), já havia decidido construir uma planta de biodiesel no Brasil, mas ficou reticente diante do poder discricionário que a MP dá ao Poder Executivo. “Eles (os dirigentes do grupo) temem que os pressupostos a partir dos quais venham a fazer o investimento possam ser modificados a qualquer momento, inviabilizando o negócio”, explicou.
As alíquotas a que se refere o texto da MP são referentes à cobrança da contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre a produção do biodiesel. Elas foram estipuladas, no conjunto, em 34,47%, mas têm redução de 100% para produtores familiares do Norte e Nordeste que façam o biodiesel a partir de mamona ou de palma (dendê); de 68% para produtores familiares de qualquer parte do país; e de 32% para outros produtores. As contribuições incidem sobre a receita bruta auferida e são de 6,15% de PIS/Pasep e 28,32% de Cofins.
O presidente da Câmara Setorial de Biocombustível do Estado de São Paulo, Miguel J. Dabdoub, considerado um dos “pais” do esforço brasileiro para a criação do biodiesel, avalia que a desconfiança em relação à regra faz sentido, ainda que duvide que o governo venha a tomar alguma iniciativa desfavorável ao programa que está criando. “Significa (o artigo 5º ) que alguém pode investir e que quando mudar o governo o Executivo diga: acabou o redutor. Como resultado, o empreendimento vai à falência”, ponderou. Para Dabdoub, somente o Congresso Nacional deveria ter poder de modificar os redutores estabelecidos.
O presidente da câmara setorial acrescenta um elemento de preocupação. Segundo ele, a própria alíquota incentivada que foi estabelecida para os empreendimentos fora da agricultura familiar está muito alta e não chega a ser estimulante para o investidor. Segundo seus cálculos, a taxação incentivada ao produtor não-familiar de biodiesel ficará em 23,44%, praticamente a mesma cobrada sobre o óleo diesel (23,63%).
“Acho que o governo está se esforçando para colocar tudo para a agricultura familiar em um primeiro momento”, disse, admitindo o mérito de se usar o biodiesel como uma ferramenta de inclusão social e de desenvolvimento regional. Mas o especialista, professor da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, argumenta que para atingir a quantidade projetada (800 milhões de litros em três anos) é preciso levar em conta que somente a agricultura familiar não será suficiente.
Para Dabdoub, serão necessários muitos projetos de grande porte se o país quiser realmente transformar o biodiesel em um elemento importante da sua matriz energética. Nesse sentido, ele considerou que foi um ganho importante a Câmara dos Deputados ter restabelecido a obrigatoriedade de mistura do biodiesel (na proporção de 2%) ao óleo diesel a partir de 2008, que havia sido derrubada no Senado.
Outro risco é o custo. No estágio atual, o biodiesel (a partir da mamona, do dendê ou da soja), seria mais caro do que o diesel de petróleo. No melhor dos casos, na versão derivada da soja, o combustível custaria o equivalente a US$ 0,50 por litro, 25% mais caro que o diesel comum no mercado internacional (US$ 0,40), já incluída a incidência da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), cobrada sobre os combustíveis no Brasil. A conclusão é do analista Adriano Pires Rodrigues, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), em artigo publicado na edição de 03 de janeiro do Valor .
As comparações de Rodrigues foram feitas considerando os preços dos vários produtos no final de novembro do ano passado, quando, segundo ele, o diesel estava com uma das suas mais elevadas cotações dos últimos 20 anos (US$ 0,32 por litro).
Valor Economico Online
10/1/2005