Crise poderá transformar Lula num presidente decorativo
09/01/2009
Guinada à esquerda implicaria perda da sua maioria no Congresso
Raymond Colitt
Correspondente do FT
O Partido dos Trabalhadores (PT), a sigla de esquerda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deveria estar comemorando neste ano em grande estilo o seu aniversário de 25 anos e o terceiro ano em que governa o Brasil, o maior país da América Latina.
Mas em vez disso, o PT e Lula passaram separadamente o fim de semana em reuniões de emergência para lidar com o escândalo de corrupção que desencadeou a pior crise política desde que assumiram o poder em janeiro de 2003.
Um aliado-chave da coalizão governista foi acusado de elaborar um esquema de propinas em empresas estatais e, a seguir, acusou o PT da pagar mesadas a legisladores em troca de apoio político.
Mesmo no melhor dos cenários, no qual se comprovaria que as alegações são falsas e o presidente e a sua equipe econômica sairiam intactos, o governo e a sua coalizão, que vai da extrema esquerda ao centro-direita, ficariam consideravelmente enfraquecidos.
Em uma reunião da liderança do PT no fim de semana, ouviu-se um coro crescente de vozes pedindo ao governo que abandone alguns dos seus aliados, tais como os direitistas Partido Progressista e Partido Liberal (PP e PL), e retome os seus valores tradicionais de esquerda.
“O governo precisa urgentemente repensar a sua aliança e a sua política econômica capitalista”, advertiu Ivan Valente, um congressista dissidente do PT.
Mas se Lula der atenção a esses apelos e abandonar os seus aliados de centro-direita, perderá a maioria no congresso e se tornará, essencialmente, um presidente decorativo [ou “lame duck”, pato manco, expressão usada para designar líderes sem poder de fato] até o final do seu mandato, em dezembro de 2006.
Nesta semana, com a esperada reforma ministerial, poderá haver uma primeira indicação da opção de Lula: manter-se no centro ou se inclinar para a esquerda.
Os investidores observarão atentamente a situação para determinar se o substituto de José Dirceu, o ministro-chefe da Casa Civil, que renunciou na semana passada, pertence ao campo “isolacionista” ou “aliado”.
Dirceu, um dos mais influentes membros do governo, foi acusado de conhecer o alegado esquema de pagamento de propinas. O seu afastamento foi providenciado para ajudar a distanciar Lula da crise.
Mas se reforçar uma aliança ampla o governo corre o risco de perder parte do seu eleitorado tradicional. “Nós já perdemos o apoio do funcionalismo público e daqueles que recebem salário-mínimo, e agora nos arriscamos a perder também a classe média devido a este escândalo”, alerta Valente.
Pesquisas de opinião realizadas na semana passada revelaram que Lula venceria a eleição geral em outubro do ano que vem por uma margem confortável. Mas, embora seja possível que a sua popularidade sobreviva, a do seu partido pode sucumbir.
“Se Lula for reeleito, ele terá menos congressistas do PT”, disse o senador petista Cristovam Buarque em uma entrevista recente. “Atualmente o PT parece ser um outro partido”.
A julgar pelo bom desempenho da moeda e dos títulos brasileiros, os mercados financeiros não parecem estar muito preocupados com a crise. O dólar fechou a semana valendo R$ 2,39, o que representa o patamar mais forte do real em mais de três anos.
Uol Mídia Global
Fonte: Financial Times
Raymond Colitt
Correspondente do FT