Crescimento pode causar novo apagão no Brasil

09/01/2009

Os investidores estão otimistas quanto à perspectiva de crescimento econômico no Brasil neste ano. Há no mercado o consenso de que o Produto Interno Bruto crescerá mais de 4,5%, algo bem acima da meta governamental de 3,5%, estabelecida no início do ano. Mas há uma preocupação cada vez maior com a possibilidade de a decrépita infraestrutura do país não acompanhar tal ritmo de crescimento e entrar em colapso, como em 2001.

Neste mês, o Operador Nacional do Sistema (ONS), um órgão misto do governo e do empresariado que fiscaliza o setor elétrico, advertiu que o país poderá enfrentar racionamentos de energia. A última vez em que a energia elétrica foi racionada foi em 2000 e 2001. Naquela época, a economia também crescia em um ritmo superior a 4,5% ao ano.

O racionamento de energia elétrica modificou esse quadro e, desde então, a média de crescimento anual tem sido de apenas 1%. A Tendências, uma firma de consultoria de São Paulo, diz que o setor elétrico precisa de investimentos de R$ 20 bilhões (US$ 7 bilhões) ao ano durante os próximos dez anos para acompanhar a demanda.

O governo deve fornecer um terço dessa cifra. Vários grupos internacionais de energia elétrica, que se arrependem de terem investido pesadamente no Brasil no final dos anos 90, enfrentam problemas ainda maiores em seus mercados domésticos. Tais grupos dificilmente fornecerão o restante dos investimentos. A conclusão poderia ser que as luzes comecem a se apagar em breve.

Fundos de pensão

Há uma centelha de esperança sobre o quadro. Um motivo para otimismo é o interesse que os fundos de pensão têm manifestado em relação ao setor. É exatamente de instituições desse tipo, nas quais tanto os compromissos quanto as necessidades de bens são regidos por metas de longo prazo, que se esperam investimentos para o setor.

Entretanto, essas instituições se sentam tradicionalmente sobre as dívidas governamentais de curto prazo e retorno elevado. Mas esse quadro começa a mudar.

A taxa de juros do Banco Central caiu de 26,5% no início do ano passado para 16% no segundo trimestre deste ano, embora um pequeno avanço da inflação tenha provocado uma elevação para 16,75% no mês passado.

Uma dívida governamental menos rentável, e um aumento maior do que o esperado no índice de preços ao consumidor, ao qual várias metas de seguro desses fundos estão vinculadas, tornaram difícil para muitos deles atingir tais metas neste ano.

Guilherme Lacerda, presidente da Fundação dos Economiários Federais (Funcef), o fundo de pensão dos funcionários da Caixa Econômica Federal, diz que quaisquer dificuldades são estritamente de curto prazo, e que a dívida do governo ainda se constitui em um investimento seguro.

A Funcef administra R$ 17 bilhões, dos quais dois terços estão sob a forma de títulos do governo com prazo de liquidez médio de menos de quatro anos. Não obstante a sua fé em tal dívida, Lacerda diz que o fundo está se empenhando para ampliar a duração do seu patrimônio financeiro. De fato, a Funcef foi pioneira ao investir na dívida pública de longo prazo.

Neste mês, a fundação comprou R$ 200 milhões de um total de R$ 210 milhões de títulos da dívida do governo que terão liquidez em 2045, com o acréscimo do índice de inflação e de juros de 9,1% ao ano.

Agora ela se prepara para conseguir mais dinheiro para o setor elétrico.

A Funcef fornecerá até 25% de um fundo que será criado nas próximas semanas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para levantar pelo menos R$ 600 milhões para investimentos em usinas termoelétricas que produzirão até 3.000 megawatts de energia.

De forma similar, a fundação está criando uma companhia específica com outros fundos de pensão para adquirir equipamentos de exploração de petróleo que serão alugados à Petrobrás. A companhia contará com cerca de R$ 180 milhões.

Infraestrutura sucateada

Outros setores brasileiros de infraestrutura também precisam de dinheiro. O transporte é um deles. Neste ano haverá uma redução de 20 milhões de toneladas na capacidade do sistema para transportar cargas aos portos no sul do país, segundo os exportadores de grãos.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior diz que, até 2007, o sistema precisará ser ampliado para transportar um adicional de 200 milhões de toneladas.

Uma fonte potencial é um novo fundo que deverá ser lançado em breve pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bird). Chamado de Fundo de Investimento em Infraestrutura do Brasil, ele tem o objetivo de levantar R$ 1,5 bilhão, dos quais o banco fornecerá US$ 75 milhões como principal investidor.

O banco espera atrair parte da grande liquidez disponível nos fundos brasileiros de pensão, permitindo que eles diversifiquem as suas carteiras e, ainda assim, alcancem as metas atuariais.

Outros investidores estão se juntando ao fundo. A GP Investimentos, um banco de investimentos de São Paulo, criou um fundo de infraestrutura de US$ 200 milhões para arrecadar dinheiro fora do Brasil. Esse é o terceiro fundo desse tipo da companhia, mas é a primeira vez que esta levantou tal tipo de capital desde 1997.

O cenário econômico brasileiro, cada vez mais favorável, reacendeu o interesse do investidor estrangeiro. Por si próprias, tais iniciativas não serão suficientes. O governo espera que mais verbas sejam levantadas por meio de uma legislação que está por vir sobre as parcerias do setor público e privado.

Mas o potencial dessas parcerias permanece incerto. Um problema é o ambiente marcado por regulamentações. Os investidores entraram no setor brasileiro de eletricidade nos anos 90, antes que as regulamentações fossem integralmente implementadas.

Embora muita coisa tenha sido feita desde então, ainda há muitos pontos incertos, incluindo a forma como as tarifas serão ajustadas. A estrutura tarifária nas telecomunicações, por exemplo, foi contestada nos tribunais, deixando muitos investidores preocupados com os poderes do imprevisível Judiciário brasileiro.

Os investidores também se preocupam com as intenções do governo. Embora tecnocratas liberais no Banco Central e o Ministério da Fazenda tenham defendido reformas neoliberais, alguns investidores temem que certos ideólogos próximos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, um partido outrora marcado por um ativismo de esquerda, ainda alimentem suspeitas quanto à iniciativa privada.

Segundo eles, embora a legislação a respeito das parcerias do setor público e privado seja bem-vinda, o governo não conseguiu usar os seus atuais poderes para transferir mais serviços públicos, incluindo o transporte, para concessões privadas.

Mas sabe-se que a necessidade é a mãe da invenção. Poucos são os que duvidam da necessidade de que seja investido mais capital privado na infraestrutura brasileira.

E começam a aparecer os canais para que isso ocorra.

Financial Times
Tradução: Danilo Fonseca