Conservador alemão é o novo Papa, Bento 16
09/01/2009
A Igreja Católica escolheu ontem o cardeal alemão Joseph Ratzinger, 78 anos completados sábado, para ser o 265º papa, se computado também são Pedro, que a tradição católica diz ter sido o primeiro pontífice.
Ratzinger adotou o nome de Bento 16.
Ao eleger Ratzinger, os 115 cardeais eleitores escolheram o mais radical defensor da ortodoxia doutrinária não só por sua função -durante 23 anos foi o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé de João Paulo 2º- mas também por suas fortes opiniões pessoais.
Bento 16 inicia o seu pontificado de maneira pouco comum. Ao contrário de seus antecessores, que costumavam desenhar sua linha pastoral a partir da missa de entronização, no domingo seguinte à eleição, Ratzinger o fez na missa imediatamente anterior à escolha.
Foi anteontem, na missa “pro eligendo papa”, que lhe coube celebrar, na qualidade de decano do Colégio dos Cardeais. Ratzinger defendeu a ortodoxia, ao dizer que “ter uma fé clara, de acordo com o credo da igreja, muitas vezes foi rotulado como fundamentalista”.
Atacou o “relativismo” -a linha liberal, no jargão da igreja. “O relativismo, que se “deixa arrastar para cá e para lá pelos ventos doutrinários”, parece ser o único sistema aplicável aos tempos modernos.”
O cardeal alemão entrou para o conclave na tarde de segunda como o favorito e o grande porta-bandeira da corrente que ele próprio assumiu como “fundamentalista”, embora preferisse chamá-la de defensora da “fé adulta”.
Ajudou-o, além de não haver cardeal que liderasse a corrente oposta, também o fato de, por sugestão sua, os cardeais terem decretado blecaute informativo nos dias anteriores ao conclave, recusando-se a dar entrevistas.
Coube a Ratzinger a última palavra antes que os eleitores se trancassem na capela Sistina. Sua homilia foi talvez o único manifesto político-doutrinário com começo, meio e fim que pôde ser emitido antes das votações.
O novo papa conquistou 2/3 necessários à eleição na quarta votação, ontem à tarde. Só se conhecerá o número exato dos cardeais que o escolheram se e quando vazarem depoimentos dos prelados, obrigados ao sigilo perpétuo.
Foi o mesmo tempo e o mesmo número de escrutínios necessários para eleger João Paulo 1º, em 1978, recorde de brevidade só superado, no século 20, por Pio 12, eleito em 1939 nos mesmos dois dias, mas com três votações.
A queima dos votos e das anotações usados no conclave deveria gerar uma fumaça branca quando o papa tivesse sido escolhido. Mas o que se viu no fim da tarde na praça São Pedro tomada por cerca de 100 mil pessoas era mais próximo de uma fumaça cinza. A eleição foi confirmada, para o público, pelo soar dos seis sinos da basílica de São Pedro, um ato novo, às 18h03 de ontem (13h03 em Brasília).
Bento 16 apresentou-se à massa como “um simples, humilde trabalhador na vinha do Senhor”. Fez um contraponto com o “grande papa João Paulo 2º”. “Consola-me o fato de que o Senhor sabe trabalhar e atuar com instrumentos insuficientes e, sobretudo, confio em vossas orações”, afirmou, antes de dar a bênção “urbi et orbi” (à cidade e ao mundo), no balcão acima da porta principal da basílica.
A eleição de Ratzinger em princípio elimina a perspectiva de abrandamento da igreja em temas relativos ao uso do corpo (métodos anticoncepcionais, casamento de homossexuais, pesquisas com células-tronco e aborto) e a flexibilização das regras sobre participação da mulher e de de divorciados na vida eclesial.
“Não será um homem que, pelo diálogo, se arriscará a diluir a fé e a doutrina”, antecipou o presidente do Senado italiano, Marcello Pera, que foi co-autor de um livro com Ratzinger.
Folha de São Paulo
20/4/2005
CLÓVIS ROSSI
IGOR GIELOW