China, a ponto de desbancar a indústria italiana de sapatos
09/01/2009
Por Kelly Velásquez
ROMA, 23 ago (AFP) – Os sapatos “Made in Italy”, uma das indústrias mais conhecidas no mundo por seu refinado design, ao mesmo tempo moderno e cômodo, sonho de gerações inteiras, podem estar com os dias contados, arrasados pela brutal concorrência chinesa.
Um dos setores estratégicos da Itália, que emprega cerca de 150.000 pessoas, fruto de uma grande tradição que combina o trabalho artesanal para curtir o couro e a criatividade, corre o risco de morrer ameaçada pela abertura do mercado para os chineses
Assim como a França, na Itália, famosas empresas de calçados, entre elas a tradicional Pollini, tiveram que fechar as portas, transformar-se ou simplesmente transferir-se para outros países, como fizeram a Geox, a Lumberjack e a Stonefly.
Cerca de 8.000 pessoas perderam seus empregos nos primeiros seis meses de 2005 e calcula-se que entre 30.000 e 40.000 ficarão desempregadas até o final do ano.
Em toda a Europa, cerca de 500.000 trabalhadores correm o risco de perder o emprego.
A desigualdade na capacidade de produção é tanta, que de acordo com cálculos da imprensa, a China cobre em seis dias a produção anual de calçados da Europa.
A crise do setor na Itália começou após a divulgação dos dados oficiais no início de agosto: a indústria dos calçados registrou uma baixa de 14% na produção.
Para todos, a culpa é da China.
É evidente que a entrada da China nesse setor-chave é um sintoma tangível das mudanças que nossa sociedade vem sofrendo por culpa da globalização.
A partir de 1o de janeiro de 2005 foram derrubadas as barreiras que estabeleciam cotas de importação aos países da União Européia para os sapatos fabricados no exterior.
“As importações de sapatos de couro da China aumentaram 700% em seis meses. Obviamente, a produção italiana baixou”, comentou recentemente o economista Marco Fortis, em entrevista à revista Panorama.
“Os chineses praticam uma competição desleal”, denunciou por sua vez o presidente da Associação Nacional de Produtores de Calçados Italianos, Rossano Soldini, representante de mais de mil empresas, que entrou com um recurso na Justiça contra a China por “dumping”, acusando este país de vender seus produtos por um preço inferior ao real.
Os fabricantes italianos, orgulhosos de sua tradição, esperam estabelecer também um selo obrigatório de qualidade, para proteger o setor, como ocorre com outros produtos, entre eles o queijo parmesão, o azeite de oliva e alguns vinhos.
Os únicos que parecem se salvar da crise são os sapatos de luxo, elaborados para uma clientela exclusiva, disposta a gastar de 400 euros (quase 500 dólares) a um milhão de dólares, como é o caso da atriz mexicana Elena Harring, cujos sapatos fabricados na Itália foram feitos com 464 diamantes.
“Não estamos em crise. Este tem sido um ano muito bom. Somos os únicos em Roma a fabricar sapatos sob medida, feitos de forma artesanal, para um cliente exigente, particular, que quer algo único”, contou à AFP a proprietária da elegante loja Dal Co, Silvia Petrucci, onde personalidades célebres, entre elas a rainha da Jordânia, costumam encomendar “calçados preciosos”.
No entanto, os problemas para os fabricantes de sapatos de luxo são muitos. Na França, marcas famosas como Charles Jourdan e Stephane Kelian declararam praticamente a falência, enquanto na Itália, firmas de renome, como a Tod’s, de Diego de la Valle, proprietário de quatro mil empresas com 35.000 empregados, se salvaram graças a uma forte ofensiva comercial justamente em países como a China e a Índia.
A luta contra o gigante asiático divide os industriais europeus, que reagem de forma diferente ao novo desafio da globalização.
“Abandonamos os sapatos para fabricar painéis solares”, comentou o dono da firma Ginev, norte da Itália, convencido de que o futuro da Europa está no desenvolvimento de alta tecnologia.
Outros, como a Prada e a Fratelli Rossetti, resistem no setor de luxo, enquanto que o fabricante do outrora famoso sapato italiano para o mercado popular tenta de diversas formas escapar dos tentáculos chineses.
Fonte:
AFP- Uol Economia
24/8/2005