Camex define destino de acordos bilaterais
09/01/2009
A Câmara de Comércio Exterior (Camex), da qual participam seis ministérios, deverá tomar posição, a curto prazo, sobre o destino a ser dado a 16 acordos de proteção de investimento assinados pelo Brasil nos anos 90 com diferentes países, e que até hoje não foram ratificados pelo Congresso.
As alternativas em análise incluem a ratificação total ou parcial dos acordos, hipótese que implicaria abrir nova negociação com os países signatários, e até mesmo a não-aprovação, o que levaria ao “enterro” definitivo dos tratados.
O caminho a ser seguido pelo governo na matéria é mantido em sigilo. Um grupo de trabalho criado em maio de 2004 na Camex, sob coordenação do Ministério da Fazenda, concluiu, em fevereiro, relatório confidencial sobre o tema. O documento, que oferece um leque de opções, foi enviado aos ministros que compõem a Camex.
“Já houve uma reunião em que o assunto foi avaliado, mas sem decisão final, e o tema deverá voltar a entrar em pauta nas próximas reuniões”, avaliou Henri Kistler, assessor da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda. O conselho de ministros da Camex reúne-se uma vez por mês, mas não é possível dizer se o tema já será incluído no próximo encontro, dia 25 deste mês. Ele pode entrar em pauta e depois ser retirado, explicou um assessor da Camex.
Nas últimas décadas, acordos internacionais de investimento, como os que foram assinados pelo Brasil, proliferaram pelo mundo. Os acordos bilaterais que tratam do assunto começaram a ser negociados no fim dos anos 50. Hoje, existem cerca de 2,3 mil tratados celebrados, segundo estimativa da Organização das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad). Na maioria dos casos, esses acordos são centrados na proteção do investidor e funcionam como ferramentas de redução do risco para países com grandes volumes de investimento no exterior.
Ao longo dos anos, governos ávidos por receber investimentos estrangeiros, sobretudo em países em desenvolvimento, fecharam acordos muitas vezes sem saber direito o que estavam assinando. O fato de haver, em muitos acordos, desequilíbrio entre direitos e obrigações do investidor levou ao crescimento de disputas em tribunais arbitrais internacionais. Esse mecanismo é previsto na maioria dos acordos em capítulos que tratam sobre a resolução de controvérsias entre investidor e Estado.
O Brasil tem resistido em incluir provisões sobre investimentos nas negociações de acordos comerciais por considerar que o mecanismo pode restringir a margem de manobra para formulação de políticas no futuro. “O que se pode dizer nesse tema é: leia os contratos antes de assinar”, provocou José Augusto Coelho Fernandes, diretor-executivo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) em um dos painéis do seminário “Acordos de Investimento: a agenda brasileira”, promovido pela entidade, sexta-feira, no Rio.
O encontro reuniu especialistas no tema, empresários e representantes de governos. Um dos objetivos do encontro foi discutir em que medida os acordos de investimento podem elevar as taxas de investimento de um país. Houve consenso entre os participantes de que os acordos por si só não garantem maiores fluxos de investimento estrangeiro. “Os acordos de proteção de investimento não são a chave para se investir em um país. O mais importante é a existência de um ambiente favorável para o investimento”, afirmou Marcelo Llévenes, principal executivo da espanhola Endesa no Brasil.
Mike Peters, presidente da americana Duke Energy no Brasil, disse que os acordos contribuem para a melhoria da imagem de um país, mas não são fatores decisivos na hora de investir. Desde 1999, a Duke Energy investiu US$ 1,5 bilhão em oito usinas hidrelétricas no rio Paranapanema com capacidade total de 2,3 mil megawatts (MW).
Outra motivação do seminário foi conhecer o andamento dos acordos de investimento firmados pelo Brasil. “O que seria melhor para o Brasil? Acertar os acordos de investimento ou usar o dinheiro disponível (no governo) para reforçar o papel das agências reguladoras?”, indagou o diretor-executivo da CNI. O embaixador Ruy Pereira, da Secretaria Geral do Itamaraty, deixou clara sua posição pessoal: “Acordos bilaterais de investimento não trazem benefício ao país, ao contrário, podem trazer até prejuízo”.
Dos 16 acordos assinados pelo país, 14 são bilaterais e envolvem países europeus -França, Suíça, Bélgica-Luxemburgo, Portugal, Itália e Dinamarca; e da América Latina, como Cuba e Venezuela. Os outros dois são regionais, acertados no âmbito do Mercosul: um é o Protocolo de Buenos Aires, referente a acordos de investimento entre o bloco e terceiros países; o outro é o Protocolo de Colônia, para investimentos intra-Mercosul.
Desse total, seis chegaram a ser enviados ao Congresso, incluindo o Protocolo de Buenos Aires. Foram retirados em 2002, com base em parecer técnico da Câmara dos Deputados, contrário à ratificação. O parecer se baseou no fato de os acordos terem abrangência muito ampla e disporem sobre condições para remessa de lucros contrárias a disposições do FMI. Também pesaram na decisão questões como tratamento nacional e tratamento de nação mais favorecida, além do tratamento diferenciado dado ao investidor estrangeiro em casos de indenizações.
Valor Economico
Francisco Góes
18/4/2005