Altas da Selic não têm efeito sobre demanda, diz Fiesp
09/01/2009
Taxa mensal de crescimento do crédito ao setor privado antes de setembro, quando começou o ciclo de contração monetária, era de 1,5%, passando para 1,48% de setembro até janeiro deste ano
Por Ricardo Muniz
EXAME A alta dos juros não passa de um sacrifício inútil. É assim que a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) qualifica a política monetária do governo Lula em um balanço que elaborou depois de sete meses de altas seguidas da Selic, a taxa básica de juros. “A Fiesp preferiu silenciar logo depois da mais recente decisão do Copom e apresentar essa análise”, diz Paulo Francine, diretor do departamento de pesquisas econômicas da entidade. Segundo o relatório apresentado nesta quarta-feira (23/3), os argumentos utilizados pelo Banco Central (BC) para defender o aperto monetário são precários, os efeitos desejados não são alcançados e, o pior, alimentam-se efeitos colaterais nocivos à economia. Como se não bastasse, atitudes do governo neutralizam seus próprios esforços para controlar a inflação.
O principal objetivo da estratégia de juros altos — arrefecer a demanda desestimulando o crédito — não está sendo atingido, diz a Fiesp. Como prova, a entidade aponta para o ritmo de expansão do crédito ao setor privado, praticamente inalterado pela escalada da Selic. O crescimento mensal do crédito ao setor privado antes de setembro, quando houve a primeira das sete altas consecutivas de juros, era de 1,5%, passando para 1,48% de setembro até janeiro deste ano. No caso dos financiamentos às pessoas físicas, o ritmo de expansão até mesmo acelerou, passando de 2,49% para 2,57%.
Além disso o aumento da Selic tem impacto reduzido no valor das prestações. Para um aumento de 20,5% da taxa de juros (de 16% para 19,25%), o custo do financiamento bancário avançou 4,4% (de 89,9% ao ano para 93,8%). Na ponta das prestações, isso representa uma alta de 1,7%, “sem efeito relevante sobre a demanda”.
Segundo a Fiesp, outro defeito de origem da linha de ação do BC é que o fim da indexação da economia, um dos pilares do Plano Real, não se completou, persistindo uma inércia inflacionária embutida nos preços monitorados, praticados por companhias privatizadas ou reguladas pelo poder público. A inflação desses preços nunca ficou abaixo dos dois dígitos desde o início do regime de câmbio flutuante, em 1999. Na melhor das hipóteses, diz a federação, caso os preços monitorados fiquem em 8,5% neste ano, ou 15% abaixo do observado no ano passado, para que se alcance a meta de IPCA em 5,1%, a margem de aumento dos preços livres será de apenas 3,6%, ou metade do registrado em 2004. Portanto, afirma a entidade, a meta é ambiciosa demais, e a autoridade monetária subestima o comportamento altista de preços fundamentais da economia, como o de petróleo. “Isso tudo sem considerar que os preços monitorados são componentes de custo dos preços livres, uma contaminação que não calculamos”, diz Francine.
O próprio governo conspira contra seu próprio esforço para controlar a inflação ao expandir o gasto público. As despesas do governo federal no ano passado foram 10,86% maiores do que em 2003, um avanço que supera a expansão da receita, de 10,66%. “A questão fiscal contribui para a expansão da demanda agregada, tornando a política monetária menos efetiva”, diz o balanço. O gasto específico decorrente dos juros, por sua vez, bateu em 4 bilhões de reais no período das altas da Selic (setembro a março), e, na hipótese de manutenção da taxa em 19,25% ao ano até dezembro, vai somar 12,6 bilhões. “Isso equivale a 130% dos investimentos federais previstos para 2005”, afirma o texto.
Exame
23/3/2005