A Normatização dos Resíduos de Serviços de Saúde
09/01/2009
Entrevista com Dra. Célia Wada
por Melissa Crocetti
mc@ecoterrabrasil.com.br
Padronizar e regulamentar um setor que ainda é pouco discutido no Brasil: os resíduos dos serviços de saúde. Com esse objetivo foi criado o Programa de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PRGSS), resolução RDC/ANVISA n.º 306, de 7 de dezembro de 2004. Isso porque não havia, até então, uma regulamentação técnica que harmonizasse as normais federais dos Ministérios do Meio Ambiente, por meio do Conselho Nacional de Meio Ambiente/CONAMA, e da Saúde, através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária/ANVISA. Fez-se necessário, então, uma atualização e complementação nos procedimentos que faziam parte da RDC 33, de 25 de fevereiro de 2003 para que se preserve a saúde pública e a qualidade do meio ambiente. A partir disso, todos os serviços de saúde em funcionamento têm prazo de 180 dias para se adequarem ao Programa e os novos já abrem dentro das normas. Os geradores destes resíduos são definidos como todos os serviços relacionados com o atendimento à saúde humana e animal, e inclui-se aí assistência domiciliar e de trabalho de campo.
O Programa é uma padronização de acordo com a necessidade de que todos os profissionais de saúde se conscientizem da problemática ambiental de forma ampla. No Brasil, as mudanças em relação ao gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde começaram a partir da década de 80, com a descoberta da AIDS, o que provocou uma mudança na conduta da higiene hospitalar. Mas só a partir de 1989 é que se firmou uma nova filosofia de tratamento de resíduos, o que diminuiu a parcela daqueles tratados como especiais, pois nem todo resíduo de saúde é infectante. Vale lembrar ainda que a separação do que representa risco à saúde pública deve ser feita pelos geradores destes resíduos.
Para falar sobre os assuntos referentes do PGRSS, a EcoTerra Brasil foi conversar com a Dra. Célia Wada*. Ela acredita que essa resolução veio na hora certa, principalmente ‘porque o pessoal da saúde é extremamente displicente com as questões ambientais. Eles não percebem que não existe saúde sem meio ambiente perfeito’, disse. Célia trabalha para que essa questão seja vista em sua totalidade e para que haja respeito às normas. Sempre atenta às resoluções ambientais de outros países na questão dos resíduos sólidos, ela está estreitando relações com o Japão, país que considera modelo no tratamento de resíduos de uma forma geral. E justamente por essa visão integrada sobre meio ambiente, Célia também está em contato com cientistas italianos para fazer experiências na Universidade de São Paulo (USP) com o que eles chamam de Manta Inibidora de Campo Eletromagnético. Trata-se de uma invenção, ainda em fase de testes, para que o ambiente esteja eletromagneticamente saudável para o organismo humano. “Quando a gente fala em meio ambiente a pessoa pensa que a gente está falando da plantinha ou do mico-leão dourado. E a nossa linha de raciocínio é a seguinte: a gente não faz nada que agrida a próxima geração. Ciclo de vida é uma coisa e inviabilização da vida é outra”, disse. Na entrevista que segue, Célia Wada explicou os objetivos do PGRSS, falou sobre o sistema de gestão integrada, implantação do Protocolo Ambiental e sobre como as instituições estão se adaptando ao programa.
O PGRSS padroniza um setor que até então não tinha regras claras. Como está sendo a implantação do Programa?
Acredito que a maioria dos profissionais da área de saúde ainda não esteja trabalhando a respeito. A implantação, dependendo da complexidade do estabelecimento, não deverá ser muito simples, pois de uma forma geral os profissionais da área de saúde não estão familiarizados com as ferramentas de gestão.
Como vai ser trabalhada a gestão ambiental de forma integrada?
Tanto os profissionais da área de saúde, quanto os das demais áreas, têm que tomar consciência da problemática ambiental. O sistema de Gestão Integrada une qualidade, meio ambiente, saúde ocupacional e segurança, que apresentam parâmetros distintos, porém altamente transversais. Com essa Gestão Integrada se constrói uma cultura receptiva a padrões de qualidade e melhoria continuada sendo, apenas dessa maneira, possível se obter a qualidade total. E não podemos falar em qualidade total sem considerarmos a qualidade ambiental.
O que é o Protocolo Ambiental?
O Protocolo Ambiental é a análise real do ambiente tendo em vistas desde a saúde do trabalhador, até a qualidade dos serviços e a preservação da sustentabilidade ambiental. Quando me refiro ao Protocolo Ambiental é algo que se tenha intenção de fazer. Não queremos apenas que se respeite a Lei, mas que exista uma mudança de postura. Falo sempre que a importância não é apenas legal, a pessoa tem que se comprometer. Resumindo, é uma postura de consciência.
Como o Programa está sendo recebido pelas instituições que devem se adaptar a ele?
Temos casos extremos: aqueles que estão empenhados e interessados e até ‘gostando’ da parte dita ambiental; aqueles que estão achando que é tudo ‘muito complicado’; e até aqueles que acham que isso ‘não vai dar nada’.
O que podemos falar sobre os danos ambientais decorrentes dos resíduos de saúde para que a população em geral seja alertada para a gravidade deste problema?
O problema é o mesmo para resíduos de saúde e para resíduos comuns. Um resíduo comum pode, dependendo de sua disposição, se tornar um resíduo altamente infectante. O problema é grave de uma forma geral. Acredito que haja uma maior problemática referente aos resíduos tipo E, que são os perfurocortantes (lâminas de barbear, agulhas, lâminas de bisturi, etc.).
Você falou sobre a padronização dos programas de resíduos e a segmentação em determinada etapa do processo, quando a análise é restrita ao tipo do material. Pode comentar sobre esse aspecto?
Ferramentas de gestão são simples e sempre seguem a mesma dinâmica. No caso de resíduos de saúde, mudamos apenas o resíduo e, logicamente, para cada tipo de resíduo é um tratamento específico, da mesma forma que nas indústrias, com os resíduos do grupo B (que contém substâncias químicas).
Hoje, no Brasil, existem estabelecimentos que procedem de forma adequada em relação ao gerenciamento de resíduos de serviços de saúde?
Sim, mas eles são em um número reduzidíssimo.
Com o tratamento que é dado hoje aos resíduos de serviços de saúde, quais são os riscos para a saúde pública?
A resolução do CONAMA 283 já vem desde 2 de julho de 2001. Dispõe sobre o tratamento e a disposição final dos resíduos dos serviços de saúde o que significa que, na realidade, isso já deveria ser do conhecimento e aplicação de todos. Porém, só agora com a resolução da ANVISA é que está sendo realmente implantado e, digo mais, tomado-se ciência de que existe. Quanto ao problema para saúde pública, acredito que o potencial de periculosidade seja relativo e que a preocupação, mesmo sendo maior, não descarta a preocupação com os resíduos de qualquer grupo.
Como vai ser a integração de cidades menores ao PGRSS?
A nova resolução permite o consórcio entre municípios, facilitando o tratamento.
O que são esses consórcios?
Funcionará com as redes de auxílio. Imagino um projeto mais amplo no qual possamos fazer um consórcio de gestão ambiental. Com todas as ferramentas disponíveis, isso inclui a reciclagem.
Quais são os países modelos em relação a esse gerenciamento?
Entre os mais desenvolvidos podemos citar a Itália (inclusive com equipamentos fantásticos), Alemanha, Espanha, Colômbia, Canadá e outros.
Sobre o seu livro, Manual de Gerenciamento de Serviços de Saúde, que saiu pela USP. Ele vai estar disponível para a população em geral?
O manual foi escrito a pedido da coordenação da FCF-USP para ser publicado para os alunos da USP, fiz algumas complementações e estarei editando um com o enfoque global de gestão participativa e será voltado ao público em geral.
Farmacêutica, bioquímica com especialização em Análises Clínicas, Medicina Nuclear, Ecologia, com publicação de artigos técnicos em portais, revistas especializadas técnico-científicas em saúde e meio ambiente. Diretora Executiva da A1 Consultores Associados, Presidente do Comitê do Meio Ambiente da Câmara Ítalo- Brasileira de Comércio de São Paulo e do Comitê do Meio Ambiente da Câmara de Desenvolvimento Sócio-Econômico da China. Presidente e fundadora da CMQV – Câmara Multidisciplinar de Qualidade de Vida. Presidente da Comissão de Proteção ao Meio Ambiente do Rotary do Aeroporto. Coordenadora e Presidente do Grupo de Pesquisas Científicas da União Farmacêutica de São Paulo. Presidente da Comissão de Meio Ambiente da ABMAE, Academia Brasileira de Medicina Anti-Envelhecimento. Também é artista plástica.
Contato pelo e-mail: celia@consultevida.com.br