Os investimentos em infraestrutura no Brasil
11/12/2012
Após ter registrado taxa de crescimento médio anual de 4,5% entre 2004 e 2010, no decorrer do último biênio, a economia brasileira desacelerou. Em 2011, o PIB expandiu a 2,7% e para 2012 os economistas prevêem outra desaceleração a 1,5%. A retomada já está em vigor desde o segundo semestre, graças, sobretudo à mudança de entonação das políticas econômicas a partir da segunda metade do ano passado.
Todavia, as previsões dos analistas privados indicam que, para o período 2013-2016, o crescimento não voltará aos níveis registrados na segunda metade da década passada. O quadro externo (sobretudo, em relação aos preços das commodities) não será favorável como no decorrer do segundo mandado do presidente Lula, enquanto internamente a dinâmica do crédito para as famílias e do emprego não fornecerá o mesmo impulso à demanda para consumos.
Alguns analistas afirmam que o modelo de crescimento brasileiro, baseado justamente na forte dinâmica dos consumos, esteja mostrando seus limites e que cada estímulo a mais à demanda se traduzirá inevitavelmente em maior inflação. Tal visão seria confirmada pelo desatrelamento das expectativas de inflação também em horizontes de médio prazo, que já se evidenciou desde o segundo semestre do ano passado. Para aumentar a taxa de crescimento potencial, hoje estimada no intervalo entre 3,5 e 4%, a atenção do governo deveria se voltar aos múltiplos gargalos do lado da oferta. Nesse contexto, os dados do recente relatório do World Economic Forum (WEF) sobre a competitividade global fornecem algumas indicações interessantes. O relatório evidencia que a carência de infraestruturas está entre os principais pontos críticos.
De acordo com a classificação de competitividade redigida pelo WEF, o Brasil, como um todo, não ocupa em 2012 uma posição particularmente retraída (48ª colocação entre os 144 países pesquisados). Isso se deve aos bons resultados em alguns fatores, como: a) relevante dimensão do mercado interno (9º lugar), b) desenvolvimento dos mercados financeiros (46º), com uma referência especial à regulamentação do mercado de ações (8º) e à solidez do setor bancário (14º) e c) eficiência do setor privado (33º). Já em relação à qualidade das infraestruturas, os resultados são muito menos otimistas. Nesse campo, mundialmente o Brasil ocupa a 107ª posição, com necessidades especiais evidenciadas nas infraestruturas dos transportes.
Como demonstrado pelos empresários brasileiros e estrangeiros entrevistados na Executive Opinion Survey do WEF, as infraestruturas são o segundo fato entre os mais problemáticos para “fazer negócios” no Brasil (17,5% das respostas). As carências de infraestrutura são precedidas apenas pelos problemas relativos ao sistema tributário, seja na dimensão da complexidade da burocracia (18,7% das respostas) que da alta pressão tributária (17,2%).
Estimativas do Banco Mundial, baseadas na experiência das economias desenvolvidas e daquelas emergentes que mais recentemente evidenciaram taxas sustentáveis de crescimento, mostram que é necessário manter uma taxa de investimento em infraestruturas pelo menos a 3% do PIB: 1% para considerar as depreciações, 1,3% para seguir o crescimento da população e 0,7% para tornar os serviços de utilidade pública universais (especialmente o acesso à eletricidade, à água potável e à rede de esgotos). Outras estimativas, que consideram mais especificamente as necessidades para a economia brasileira, sugerem que uma taxa de 2% do PIB seria suficiente apenas para manter o estoque de investimentos nesta economia.
Até a década de 80, o Brasil conseguia empenhar recursos a quantidades superiores àquelas sugeridas pelas estimativas do Banco Mundial. A partir dessa mesma década – em razão das turbulências macroeconômicas que levaram a longos períodos de alta inflação e do aumento da despesa pública corrente – assiste-se, ao invés, a uma queda dos investimentos em infraestruturas. Esses passaram dos 5,4% nos anos 1970 aos 2,3% da última década .
A contração dos investimentos é notadamente marcada no setor dos transportes (de 2% do PIB nos anos 1970 a 0,7% na última década) e na rede elétrica (de 2,1% a 0,7%). Os atrasos nos investimentos se refletem na baixa qualidade das infraestruturas. Dos 1,6 milhões de quilômetros de estradas, que fazem do Brasil um dos países com a rede viária mais estendida, em 2009 apenas 13% estava asfaltado (em leve aumento dos 10% em 2000). Da parte asfaltada, menos da metade era considerada em estado bom ou muito bom. O dado é relevante, considerando que mais de 70% das mercadorias brasileiras é transportado por estrada (8% na China, 24% na Austrália e 26% nos Estados Unidos). Os aeroportos estão superlotados. Em 2010 apenas três deles (Rio de Janeiro Galeão, Salvador e Recife) operavam dentro do limites recomendáveis pelas autoridades considerando os picos sazonais (80% da capacidade máxima), com os mais movimentados que apresentavam taxas de utilização de mais de 130%. Enfim, um dado mostra a necessidade dos investimentos na rede hídrica: em 2009 somente pouco mais de um terço (35%) dos esgotos eram tratados.
Continuando a investir em infraestruturas pouco mais de 2% do PIB ao ano, o Brasil dificilmente preencherá a lacuna existente com os principais países emergentes. Aqueles asiáticos, por exemplo, fizeram significativos esforços para modernizar as infraestruturas. Entre 1998 e 2003, os investimentos chineses em infraestrutura cresceram de 2,6% do PIB a 7,3% (dos quais, 4% para os transportes). No mesmo período, a Tailândia passou de 5,3% para 15,4% do PIB (quase 4% para os transportes). Filipinas e Vietnã já investiam, desde o início da década passada, cifras superiores àquelas brasileiras (3,5 e 10% do PIB respectivamente). Também na América Latina a situação parece melhor. Especialmente o Chile ampliou os investimentos em infraestruturas após 1995 levando-os para mais de 6% do PIB (dos quais 2% para os transportes) graças a uma legislação favorável para o envolvimento do setor privado nos projetos (mais de dois terços dos investimentos em infraestruturas são financiados por estruturas privadas). Em 2001, a Colômbia investia quase 6% do PIB em infraestruturas.
Em 2007, o governo brasileiro lançou o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), sucessivamente renovado em 2010, com o objetivo de investir mais de R$ 900 bilhões (19% do PIB) no período 2011-2014, dos quais mais de 50% no setor da energia e do petróleo (com a contribuição de empresas de participação estatal, como a Petrobras). A impressão é que, além dos atrasos crônicos da sua implementação, o PAC, mesmo se tivesse sido 100% realizado, resolveria apenas em parte os problemas das infraestruturas brasileiras. Algumas análises mostram que no setor dos aeroportos, por exemplo, fazendo estimativas conservadoras sobre a evolução da demanda e considerando os investimentos previstos para a ampliação da capacidade, apenas três deles (Rio de Janeiro, Campinas e Manaus) operarão abaixo do teto máximo recomendado pelas autoridades (80%) em 2014. Em relação às estradas, só 13% dos investimentos considerados necessários para a modernização da rede para os próximos três anos estão inclusos nos investimentos do PAC.
Enfim, também existe o problema de como encontrar os recursos para financiar os investimentos em um país como o Brasil, cuja taxa de poupança é relativamente baixa. No passado, notou-se uma forte correlação negativa entre a demanda total para investimentos e o saldo corrente da balança dos pagamentos (coeficiente de correlação de -0,9): na elevação da relação entre despesa para investimentos e produto sempre se acompanhou o aumento do déficit das contas da administração pública. Tal resultado indica que, antigamente, o esforço para ampliar o estoque de capital produtivo na economia, incluindo as infraestruturas, foi mediamente obtido recorrendo a fontes externas de financiamento. Estima-se que os investimentos diretos – considerados uma fonte de financiamento estável e mantidos elevados mesmo em ocasião da recente crise europeia (2,5% do PIB em média no último biênio, em relação a um déficit das contas da administração pública de 2,2%) – continuarão a fluir no Brasil. Todavia, parece necessário um esforço em dois aspectos. De um lado, o governo deveria ampliar o espaço no balanço público para empenhar nos investimentos (hoje, no total, equivalente a 1% do PIB aproximadamente) invertendo uma tendência histórica que favoreceu o aumento da despesa corrente. Desde a década de 80, a pressão fiscal realmente aumentou em dez pontos percentuais em torno de 35% do PIB, enquanto os investimentos em infraestruturas, como indicado anteriormente, se contraíram de cinco para dois pontos percentuais do PIB. Em segundo lugar, existe a necessidade de criar uma agenda de reformas voltada a estimular a economia privada (com a reforma previdenciária, por exemplo) e reforçar os esforços para tornar atraentes aos investidores os instrumentos financeiros privados (entre os quais, infrastructure bond)