Exportadores brasileiros perdem mercado

09/01/2009

“O mesmo risco que a gente corre quando vacila com uma namorada bonita acontece quando uma empresa tem que abrir mão de um mercado. Logo aparece alguém mais interessante e fica praticamente impossível recuperar o terreno perdido”. De forma bem-humorada, o vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Ricardo Wirth, ilustra a difícil situação pela qual vêm passando as empresas exportadoras brasileiras.

Estima-se que 898 deixaram de exportar no último quadrimestre. Dessas, 52,2% das vendas estão concentradas em 69 grandes companhias – que ameaçam não renovar seus contratos de exportação por estarem perdendo rentabilidade. O volume de mercadorias embarcadas caiu 11,12% em abril.
A forte valorização do real em relação ao dólar já faz alguns especialistas acreditarem que o Brasil não vai alcançar a meta de exportar US$ 132 bilhões em 2006. As projeções giram em torno de US$ 120 bilhões. “Quem é grande está aumentando a exportação, enquanto os pequenos estão saindo. E isso está acontecendo por causa do câmbio”, analisa o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. “Diversas empresas estão dizendo que não pretendem renovar seus contratos. Quando me perguntam o que acho, respondo: resistam o máximo que puderem, pois é ainda mais difícil voltar ao mercado”, conta.
O coordenador do Conselho de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiergs, Cezar Muller, explica que os contratos de exportações geralmente são de longo prazo e o trabalho de conquistar espaço em outro país é árduo. Sendo assim, situações econômicas adversas transitórias geralmente não são suficientes para mudar as estratégias de venda das empresas. Porém, um momento como o vivido pelo Brasil nos últimos meses já começa a exigir medidas mais drásticas. “Temos casos de empresas perdendo negócios por falta de competitividade e abrindo mão de contatos externos para não comprometerem a sua situação financeira. Como vivemos esse processo há bastante tempo, acabamos dando oportunidade para os concorrentes tomarem espaço”, lamenta.

Caso a situação continue dessa forma, Müller diz que haverá uma continuada redução das exportações, principalmente dos produtos de maior valor agregado. “Não é um processo brutal no primeiro momento, mas passa a ser de constante decréscimo, o que pode ser ainda mais perigoso”, sugere. As conseqüências disso, segundo ele, são os processos de demissão, redução do volume de produção e fechamentos de fábricas. Situações essas que podem ser facilmente ilustradas pelos setores coureiro-calçadista, moveleiro e de máquinas agrícolas.
No ano passado, o setor calçadista brasileiro vendeu 20 milhões de pares a menos do que em 2004. Este ano, esse número deverá se repetir, de acordo com as estimativas da Abicalçados. A grande vilã, de acordo com os empresários, continua sendo a questão cambial. “O custo aumentou em função do dólar e o mercado não absorveu. E quanto mais caro o produto, menos vendemos”, lamenta o vice-presidente da entidade, Ricardo Wirth.

Segundo ele, esses 40 milhões de pares perdidos pelas empresas entre 2005 e 2006 significam um mercado que acabou sendo conquistado pelos competidores. Em 1993 foram exportados 201 milhões de pares de calçados, considerado o melhor ano para o setor. Depois de alguns anos difíceis, houve uma recuperação 2004, quando o volume chegou a mais de 210 milhões. Nesses primeiros quatro meses do ano, foram 5,8 milhões de pares perdidos.
As empresas gaúchas, responsáveis por cerca de 70% da exportação nacional em termos de volume, são as que mais sofrem. Algumas fábricas fecharam, outras reduziram produção e algumas já começam a rever contratos de exportações. “Hoje, não temos como dizer que exportação é um bom negócio”, admite Wirth.
Ele avalia que já virou rotina as empresas fecharem contratos de exportações com margens negativas ou até mesmo sem margem para depois correr atrás do prejuízo. “Elas alinhavam os negócios e, então, tentam alguma redução de custos com os fornecedores. A matéria-prima representa mais da metade do preço dos calçados e a indústria acaba repassando essa pressão”, explica.

Uma das alternativas que o setor está buscando para minimizar os prejuízos tem sido a busca da diversificação de mercados. Há sete anos, os Estados Unidos eram o destino de 80% das vendas externas brasileiras. Hoje, esse índice já é de 40%. “Foi uma estratégia importante já que o mercado americano é o mais sensível a preço. Lá predominam os grandes compradores e eles acabam encontrando preços mais acessíveis na China”, destaca. (Com Agência Globo)

Móveis e calçados contabilizam perdas no Estado

O vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Ricardo Wirth, administra a Indústria de Calçados Wirth, que está há 58 anos no mercado. A empresa exporta há 36 anos e manda para o exterior 95% da produção de 2 milhões de pares por ano. Dos 11 mil pares produzidos por dia, houve uma redução para nove mil pares. “Estamos trabalhando para voltar à produção anterior, mas está difícil”, constata.
No segmento moveleiro, a situação é semelhante. Dados da Associação das Indústrias de Móveis (Movergs) mostram que, na comparação de janeiro a abril de 2006 com o mesmo período do ano passado, o Brasil baixou em 11% suas exportações de móveis. No caso do Rio Grande do Sul, essa queda foi de 7,4%. De março de 2005 a março de 2006 o setor moveleiro gaúcho – segundo maior estado exportador – fechou 35% dos seus postos de trabalho, o que representa 10,5 mil trabalhadores. “As empresas reduzem o número de funcionários e enxugam custos para manter a estrutura funcionando enquanto essa crise perdura”, afirma o presidente da entidade no Estado, Luiz Attilio Troes.
O gerente de
exportações da empresa Multimóveis, Marcelo Zortéa, diz que a empresa faz contratos com o câmbio flutuante para evitar maiores prejuízos. Mas, isso não impede que os clientes internacionais acompanhem as pequenas variações da moeda para pedir desconto. “Basta o dólar subir um pouco para nos ligarem e tentar renegociar. Entretanto, eles não sabem que a situação é crítica e que as empresas estão trabalhando sem margens e até mesmo no vermelho.”
A Multimóveis, com sede em Bento Gonçalves, exporta cerca de 40% da sua produção. A expectativa é de que a empresa tenha uma queda de 30% nas exportações. (PK)

Manufaturados são os mais atingidos

As grandes empresas, que venderam mais de US$ 100 milhões nos primeiros quatro meses do ano, responderam por 52,2% do total dos dólares que entraram no Brasil devido às vendas externas. Esse percentual foi de 45,79% no primeiro quadrimestre de 2005 e era de apenas 32,30% em 2002, segundo o Ministério do Desenvolvimento.
Segundo o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, os produtos mais afetados pelo câmbio são os manufaturados, que não têm cotação em bolsa, como ocorre com as commodities.
Ele chama a atenção para a queda, nas últimas semanas, da média diária exportada, que está em cerca de US$ 475 milhões, quando o ideal para se alcançar a meta de US$ 132 bilhões seria uma média de US$ 552 milhões. “Se projetarmos as vendas externas para os números de hoje, o total exportado em 2006 seria de US$ 120 bilhões”, diz.
O coordenador do Conselho de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiergs, Cezar Muller, analisa que a situação no Brasil pode acabar sendo mascarada na medida em que a balança comercial é positiva. Porém, isso acontece justamente e função da melhoria dos preços das commodities. “Como elas têm baixo valor agregado, não é dessa forma que será possível sustentar a máquina exportadora. O modelo que temos que buscar para o Brasil é o que prevê a substituição das exportações de matérias-primas por produtos industrializados, exportando mais produtos manufaturados”, sugere.

Fonte:
Jornal do Comercio
(AG)