Exportações podem afetar crescimento doméstico

09/01/2009

O surpreendente vigor das exportações terá um efeito colateral negativo na economia que só agora começa a ser medido pelos analistas. Consumo e investimento domésticos tendem a crescer menos para que as contas nacionais fechem sem pressionar a inflação.

O ponto de partida para as discussões é o relatório de inflação que o Banco Central divulgou há duas semanas, que traz uma reestimativa para o Produto Interno Bruto (PIB) em que a demanda externa (exportações menos importações) tem um efeito claramente positivo sobre a economia em 2005. A autoridade monetária não revelou os números, mas, pelos cálculos de analistas do setor privado, a contribuição acima do esperado da demanda externa no PIB será entre 0,5 e 1 ponto percentual (pp). No relatório de dezembro, o BC previa um papel neutro (0,1 pp) da demanda externa.

O dado que chama a atenção, porém, é que a projeção do BC para o crescimento do PIB total foi mantida em 4%. Ou seja: as exportações líquidas do país estão crescendo à custa de um menor crescimento interno. Não será uma tragédia: ainda assim, a absorção doméstica terá variação positiva. Mas os números terão um pouco menos de brilho do que os 2,2 pp esperados pelo BC em dezembro para o consumo das famílias; de 1,4 pp para investimentos; e de 0,3 pp do consumo do governo.

O economista-chefe da MCM Consultores, Celso Toledo, explica que uma surpresa externa como essa pode ser absorvida de três formas. Uma delas é o crescimento maior da economia. Ele pondera, porém, que isso só é possível quando há capacidade ociosa na economia. Desde fins de 2004, o que se vê, entretanto, é o rápido preenchimento da capacidade ociosa.

A segunda alternativa é acomodar a demanda mais forte com um PIB maior, mas também com mais inflação. “É pouco provável que o BC aceite isso.” A terceira opção é absorver a demanda externa com sacrifício de consumo e/ou investimento.

Tomás Málaga, economista-chefe do Itaú, fez uma série de exercícios para investigar a possível contribuição da demanda externa no PIB. Ele toma 2004 como ponto de partida, quando as exportações cresceram 18%, e as importações, 14% – e, no conjunto, deram uma contribuição de 1,1 pp ao PIB. Se os mesmos percentuais se repetissem em 2005, afirma ele, a contribuição seria de 1,3 pp, já que em 2005 a corrente de comércio é maior.

Málaga pondera, porém, que é bem provável que as importações fiquem mais fortes. Se elas crescerem mais rápido (20%) do que as exportações (18%), ainda assim a contribuição para o PIB seria positiva em 0,7 pp.

O outro lado da moeda é que a demanda doméstica cresceria menos. Em dezembro, o Itaú trabalhava com uma hipótese similar à do BC para a demanda externa – contribuição próxima de zero – para uma expansão entre 3% e 3,5% do PIB. Ou seja, investimentos e consumo de governo e famílias cresceriam de 3% a 3,5%. Agora, como a demanda externa dá sinais de maior vigor, sobra para a demanda interna uma contribuição entre 2,3 e 2,8 pp.

No fundo, diz Málaga, está-se diante de uma escolha intertemporal. “Exportar mais (em termos líquidos) significa reduzir passivo externo, comprometendo menos o consumo no futuro”, afirma. “Mas essa opção se traduz em um sacrifício hoje, representado por um menor consumo.”

Mônica Baer, da MB Associados, diz que, a princípio, estimava uma contribuição negativa da demanda externa no PIB. Esses números tendem a se alterar com a reestimativa das exportações, que devem chegar a US$ 34 bilhões, ante US$ 30 bilhões projetados anteriormente. Mas ela pondera que é cedo para medir os eventuais impactos na absorção doméstica – não se pode descartar, diz, um maior crescimento do PIB total.

Também a Tendências avalia que a demanda externa está acima do esperado. “Provavelmente, irá provocar tanto uma menor absorção doméstica quanto uma revisão para cima do PIB”, diz o economista Guilherme Maia.

Valor Economico
13/4/2005