Câmbio e salários derrubam rentabilidade

09/01/2009

Mesmo com preços maiores, ganho do exportador caiu em 23 setores analisados pela Funcex

A valorização do câmbio e o aumento dos custos internos, especialmente salários, afetaram o ganho do exportador pelo terceiro ano consecutivo. Entre 27 setores analisados pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), a rentabilidade recuou em 23 deles. A perda média foi de 12%, ampliando a queda acumulada desde 2003 para 26%.

Os custos de produção dos setores exportadores, por sua vez, aumentaram 6%, em média, mas em alguns segmentos, como o de peças e outros veículos, a alta chegou a 12%. Parte da alta de custos foi repassada com a alta média de 12,2% nos preços de exportação e mesmo assim a rentabilidade variou de uma perda de 28,1%, em equipamentos eletrônicos, até uma alta de 4,4% em petróleo e carvão.

Os fabricantes de peças amargaram recuo de 22,9% nos seus ganhos em 2005. Em três anos, a rentabilidade caiu 46,8%. “Já há empresas deixando de cumprir contratos”, conta Paulo Butori, presidente do Sindipeças, entidade que representa o setor.

Butori diz que a valorização do real frente ao dólar foi o principal motivo dos resultados negativos, mas lembra também que houve pressão de custos. Os salários dos metalúrgicos do ABC que trabalham nas autopeças subiram 3% acima da inflação. “A chapa de aço está mais barata no mercado externo do que aqui”, afirma ele. Butori conta que há empresas importando aço fundido do Irã. “E olha que essa é uma área em que somos muito competitivos. Para chegar a esse ponto é porque há algo de muito errado com o dólar.”

O cenário também é nebuloso na siderurgia. Carlos Loureiro, diretor-presidente da Rio Negro, distribuidora de aço, diz que a preocupação do setor vai além da queda de rentabilidade no exterior. “A perda de competitividade das indústrias que usam o aço de forma intensiva também preocupa”, diz Loureiro. Ele explica que para a siderurgia o real valorizado traz efeitos benéficos, pois ajuda a derrubar o preço de insumos. Carvão e minério de ferro, entre outros, tem cotações definidas no mercado internacional. “Esses preços caíram, mas como a valorização do real foi muito maior, não houve compensação.” O empresário cita ainda a alta do custo da mão-de-obra como ponto de pressão.

Ele conta que a partir de abril é bem provável que deixe de exportar tubos de aço para empresas dos Estados Unidos. São cerca de 3 mil toneladas vendidas mensalmente. “Chegamos ao limite. Um, dois meses no vermelho, perdendo dinheiro, ainda vai, mas depois de um tempo, não há como segurar”. Mesmo sabendo que pode perder mercado, Loureiro diz que é melhor deixar de exportar e esperar que o câmbio fique mais favorável.

André Rebelo, economista da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), entidade que vem batendo na tecla de um câmbio menos valorizado há muito tempo, diz que não há nada que possa compensar uma alta de 17% no real, nem mesmo uma queda de insumos importados. E, pelo levantamento da Funcex, mesmo com o dólar mais barato, os preços dos produtos importados subiram 11,1% em 2005. Para Rebelo, esse movimento de alta reflete o aquecimento da economia mundial. “Nossas exportações estão crescendo, mas a dos demais países do mundo também, ou seja, há uma pressão de demanda”.

O custo com pessoal não foi nem um pouco desprezível, comenta o economista. Pelos dados da Fiesp, o total de salários reais pagos pela indústria paulista teve incremento de 11,3% em 2005. O salário real médio ficou 6,7% maior e o custo restante veio do aumento de pessoal empregado. Segundo Rebelo, a remuneração média atingiu um pico em 2002, mas cresceu perto de zero no ano seguinte e foi acompanhada pelo aumento do desemprego. Hoje, o rendimento está sendo recomposto, com seguidos reajustes acima da inflação. Em 2005, a folha de pagamento real da indústria brasileira subiu 3,4%. Nos últimos três anos, a alta chega a 8,7%.

No setor têxtil, o câmbio valorizado também foi o grande culpado pela perda de rentabilidade, segundo o diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel. O aumento de salários teve impacto, mas foi mais modesto. Ele diz que as indústrias de confecção, mais intensivas no uso da mão-de-obra, sofreram mais o efeito dos reajustes. O aumento para os trabalhadores do setor ficou em 7% em 2005, diante de uma inflação de 5,7% de acordo com Pimentel. Os números da Funcex mostram que a rentabilidade das exportações da indústria têxtil caiu 18,3% no ano passado.

O índice de rentabilidade das vendas externas de calçados, couros e peles caiu 12,8%. Os empresários do segmento também apontam o dólar barato como o principal responsável pelas agruras de 2005. “O câmbio vem em primeiro lugar e depois os salários”, diz o presidente do Sindicato da Indústria Calçadista de Franca (Sindifranca), Jorge Félix Donadelli, ao explicar o que atingiu a rentabilidade do setor. No ano passado, os trabalhadores da categoria, que têm data-base em fevereiro, receberam um aumento de 11,32%, bem acima dos 5,86% acumulados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) em 12 meses. Com o mau desempenho das exportações, as empresas calçadistas de Franca cortaram 4.500 empregos em 2005, segundo Donadelli.

O quadro poderia ser ainda pior se o segmento não tivesse conseguido aumentar em 10,1% os preços de suas exportações, como mostra a Funcex. O mesmo não ocorreu com o setor têxtil, com reajuste de apenas 0,5%. Houve casos ainda piores, como o de equipamentos eletrônicos, em que os preços não só não aumentaram como caíram com força (10,8%). Não por acaso, a rentabilidade das exportações recuou 28,1%.

Para este ano, a situação não parece das mais melhores para os exportadores. O economista Sérgio Vale, da MB Associados, lembra que o câmbio mantém a trajetória de valorização e, tudo indica, poderá buscar a casa de R$ 2 nos próximos meses. Ele aposta em reajustes salariais menores nos setores ligados à exportação, como forma de diminuir a pressão de custos.

Fonte:
Valor Economico
Raquel Salgado e Sergio Lamucci