Brics crescem com cenário adverso
07/07/2008
Simone Cavalcanti e Ana Carolina Saito, Jornal do Brasil
SÃO PAULO – O grupo formado por Brasil, Rússia, Índia e China (Bric) tem condições de passar pela atual turbulência internacional com inflação em alta, ciclos de apertos monetários e risco de recessão leve nos Estados Unidos e ainda manter as economias em franca expansão. Pelo panorama que se desenha é inevitável certo desaquecimento, mas, mesmo assim, as projeções para esse clube restrito estão em alta.
– Os Brics são a nova locomotiva da economia mundial, que relutam em devolver o ganho que tiveram na última década – ressalta o diretor de Pesquisa Macroeconômica do Bradesco, Octávio de Barros.
Pelas projeções recentes da agência classificadora de risco Fitch Ratings, em 2009, por ordem de sigla, esses países apresentarão taxas de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de 4,1%, 6,7%, 8,5% e 10%. E em 2010, de 4,3%, 6,0%, 8,7% e 10%, respectivamente.
Pela dinâmica própria de crescimento e o potencial agrícola e mineral, o Brasil é classificado como o mais bem preparado entre os pares. Afinal, o país vende o que todo mundo precisa, complementa Ilan Goldfajn, ex-diretor do Banco Central e sócio-diretor da Ciano Investimentos.
O país tem fatores internos de geração de crescimento, e, por esse motivo, pode ser menos impactado por questões externas.
– Imune ninguém é, mas é nossa própria dinâmica interna que ajuda – diz Rafael Guedes, diretor-executivo da Fitch no Brasil. Além disso, alinhava Guedes, o Brasil nunca foi um país de ter planejamento de longo prazo, sempre houve questionamento dos empresários a respeito do ciclo eleitoral e, por isso, os investimentos sempre foram mais modestos e com horizontes menores.
– Mas, a partir de 2003, viu-se que éramos como os outros países, que seguíamos regras, e os investimentos de mais longo prazo começaram a surgir – disse Guedes.
Essa mudança interna que ocorreu nos últimos anos, apesar de não ter chegado ao ideal — o Brasil ainda é o que tem as maiores carga tributária e taxa de juros nos Bric — já ajuda na continuidade da taxa de crescimento.
Assim, Barros projeta expansão econômica de 4,8% para a economia brasileira neste ano, 3,5% em 2009 (por conta dos ajustes para o combate à inflação) e entre 4% e 4,5% em 2010. Goldfajn diz acreditar que é possível ter percentuais de expansão entre 4% e 4,5% pelos próximos três anos.
Cenário
Alessandra Ribeiro, economista da área de mercados e internacional da Tendências Consultoria, projeta uma desaceleração de 4,8% para 4,1% no crescimento da economia brasileira deste ano para 2009. No caso da China, a expectativa é a redução de quase um ponto percentual, para 8,5%. Índia e Rússia devem diminuir as taxas de 7,6% para 7,1% e de 7,2% para 6,4%, respectivamente, segundo projeções do mercado.
– Eles vão apresentar desaceleração, mas não vejo nenhum deles degringolando ou abortando o crescimento. Ainda mantém ritmo forte de crescimento e vão desempenhar um papel importante na economia mundial – diz.
A economista afirma ainda que o Brasil está à frente dos demais países do BRIC em relação ao ambiente macroeconômico. A vantagem em comparação com os demais vem da adoção do sistema de metas de inflação, câmbio flutuante e compromisso com o superávit primário.
Com o crescimento robusto, os Brics, aliás, ampliam, cada vez mais a participação na economia mundial. Barros diz que em 2020 o PIB nominal chinês se equiparará ao norte-americano.
Segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), os quatro países representavam uma fatia de 8,1%, o correspondente à 26,1% da economia americana. Para 2008, o percentual deve chegar 14,1% e Brasil, Rússia, Índia e China devem ter juntos um PIB equivalente a 59,8% ao dos Estados Unidos.
Se a dinâmica atual for mantida, a cada dois anos, os Brics reduziriam a diferença em 10 pontos percentuais em relação aos Estados Unidos, afirma Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, ao citar projeções do FMI.
– Com isso, entre 2015 e 2016, a economia dos quatro países se igualaria à dos Estados Unidos – calcula.
Pagando a conta
Os bons ventos que promoveram o crescimento da economia mundial de quase uma década geraram a inflação como efeito colateral.
– E esse fenômeno coletivo precisará de um remédio coletivo – ressalta o ex-diretor do Banco Central e sócio-diretor da Ciano Investimentos, Ilan Goldfajn.
O medicamento é o ciclo de aumento das taxas de juros em vários países que já começou para conter a pressão altista dos preços. Isso levará a uma desaceleração das taxas de crescimento.
Para Barros, a grande questão é quem pagará a conta. Todos vão pagar um pouco ou com alta de juros, baixo crescimento ou deixando a inflação comer. Comparado aos demais países do Bric, o Brasil é o que apresenta a posição mais "tranqüila" em relação à alta de preços, diz Alessandra Ribeiro. Enquanto a inflação brasileira acumula alta de 5,58% em 12 meses até maio, Índia (7,8%), Rússia (15,1%) e China (7,7%) amargam taxas superiores de elevação. De qualquer forma, diz, o sinal é o mesmo para os quatro: de aumento de juros. E, no caso chinês, de elevação da taxa de depósito compulsório dos bancos.
Fonte:
JB Online