Brasil tira vantagem do bom momento
09/01/2009
8 de Outubro de 2004 – O governo brasileiro aproveitou, de modo acertado, a situação extremamente favorável de disponibilidade de recursos para investimentos no mercado internacional e conseguiu colocar nesta quarta-feira títulos da dívida do Tesouro Nacional no montante de US$ 1 bilhão, ante uma perspectiva inicial de captação de US$ 750 milhões. E o interesse era tanto que a demanda teria atingido entre US$ 4 bilhões e US$ 5 bilhões, na opinião de analistas.
A situação favorável do mercado financeiro internacional decorre de vários fatores. Um deles é a queda do risco dos países emergentes, que também têm tirado vantagem da situação e emitido bônus e títulos da dívida. O Brasil se inclui entre os países com maior redução do risco desde maio de 2004. Atualmente o risco-país é de 451 pontos, um dos mais baixos do País desde dezembro de 2002. Além disso, há investidores interessados em papéis com boa rentabilidade, e os bônus brasileiros ofereceram remuneração anual de 9,15%, além de um deságio de 2,22%, ao serem vendidos por 97,78% do valor de face. Nesse nível, os juros oferecidos estão 4,92 pontos porcentuais acima da taxa de referência dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos.
Outro fator foi o Relatório sobre a Estabilidade Financeira Global – 2004 divulgado há cerca de 20 dias pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), que elogia o Brasil e diz que o País está sendo “recompensado por suas boas políticas recentes”. Ou seja, por estar seguindo à risca a cartilha do próprio FMI, o que pode ser uma vantagem para a tranqüilidade e o bom desempenho do sistema financeiro internacional, mas vem constituindo um entrave ao crescimento econômico do País.
A captação realizada faz parte da estratégia oficial de aproveitar o bom momento da economia internacional para estocar reservas tendo em vista os compromissos da dívida externa de 2005, quando o País terá de desembolsar US$ 12,3 bilhões para o pagamento de juros e amortizações. Isso porque o cronograma de captações para este ano, no montante de US$ 4 bilhões, já havia sido concluído com folga em setembro. Nesse mês, na primeira emissão de títulos da dívida em euros, pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi captado € 1 bilhão, com lançamento inicial de € 750 milhões no dia 8 e reabertura de emissões duas semanas depois, com captação de € 250 milhões.
A operação realizada nesta semana ocorre a tempo de recompor em parte as reservas internacionais do Brasil, uma vez que esses novos recursos ingressam no País no dia 14 e, já no dia seguinte, o governo brasileiro terá de saldar US$ 1,8 bilhão em dívidas cambiais que vencem nessa data.
A colocação de títulos da dívida brasileira também estimula o lançamento, em mercados internacionais, de papéis de empresas brasileiras, não só estatais, mas também privadas. Aproveitando essa boa onda, a Eletrobrás pretende captar US$ 500 milhões no início de 2005. E há a possibilidade de empresas privadas também recorrerem ao mercado internacional para financiar a produção caso as perspectivas de crescimento da economia se mantenham.
Se, por um lado, a captação do Tesouro contribui para eliminar eventuais pressões que poderiam influenciar o mercado doméstico de câmbio com o pagamento de US$ 1,8 bilhão da dívida, por outro, os vencimentos privados no exterior em novembro e dezembro e o aumento das importações no final do ano podem exercer pressões sobre o câmbio. A projeção média do mercado, segundo o próprio Banco Central (BC), é de que o dólar chegará próximo de R$ 3,00 no fim de dezembro. Nesse momento, as autoridades monetárias precisarão ter discernimento para manter o dólar num patamar que continue estimulando as exportações e um superávit comercial folgado, sem recorrer às reservas para sobrevalorizar o real, o que teria conseqüências funestas sobre o crescimento, como a história recente demonstrou à exaustão.
Nesse céu de brigadeiro do cenário internacional, entretanto, há uma nuvem de instabilidade momentânea, que – tudo faz crer – poderá se desvanecer no início de 2005. É o preço internacional do petróleo, que ontem bateu novos recordes: US$ 52,67 para o tipo WTI; e US$ 48,90 para o Brent.
Essas sucessivas altas recordes, embora sejam atribuídas a fatores políticos na Nigéria, como a anunciada greve de petroleiros, e às conseqüências do furacão Ivã no Golfo do México, estão relacionadas a um jogo pesado de especulação no mercado futuro de petróleo. Segundo denunciou o presidente da venezuelana PDVSA, Alí Rodríguez, esses mercados negociam 160 milhões de barris por dia, quando a extração mundial é de apenas 84 milhões. Quando esse jogo acabar, o mercado voltará à normalidade, com o petróleo cotado entre US$ 30 e US$ 36 o barril.
Gazeta Mercantil
8/10/2004