Aeronáutica aceita passar controle de tráfego para civis
09/01/2009
BRASÍLIA – novo comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, aceita negociar a desmilitarização do controle de tráfego aéreo. Em suas primeiras declarações no cargo, ele manifestou disposição em discutir o assunto e sinalizou com a retomada do Projeto FX, de compra de caças para modernizar a frota da Força Aérea Brasileira (FAB). Saito, que só aprendeu a falar português aos sete anos de idade e tornou-se o primeiro nissei a alcançar o topo da carreira militar, tomou posse ontem no lugar do tenente-brigadeiro Luiz Carlos da Silva Bueno.
” O Comando da Aeronáutica não pleiteia que a atividade de controle do espaço aéreo seja de sua exclusividade ” , afirmou Saito, antes de fazer uma importante ressalva. Qualquer mudança, emendou o novo comandante, ” certamente será fruto de uma criteriosa análise técnica, financeira e operacional ” . Ele argumentou que os índices de segurança registrados no Brasil são ” significativos ” e classificou como ” invejável ” a estrutura montada pela Aeronáutica nos últimos 30 anos. Segundo o militar, o sistema de defesa e controle do espaço aéreo tem sido objeto de consultas por vários países, sobretudo após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos.
Saito assume o posto em meio à pressão dos controladores de vôo por uma reestruturação da carreira. O governo decidiu prorrogar por mais 30 dias os trabalhos do grupo responsável por apresentar propostas de solução à crise do setor. Uma das idéias analisadas pelo governo é conceder uma gratificação salarial aos controladores militares ou permitir que eles migrem para a carreira civil, mais bem remunerada. O salário inicial dos civis é de R$ 3.148 – os militares na mesma função, entre primeiro e terceiro-sargento, ganham entre R$ 2,4 mil e R$ 3,7 mil. Em rápido pronunciamento, Saito evitou polemizar, mas afirmou que as condições de trabalho dos integrantes do sistema de controle de tráfego aéreo são ” apropriadas ” .
O ministro da Defesa, Waldir Pires, disse que busca uma solução de consenso e refutou o estabelecimento de prazos. ” Nas coisas públicas não há esse prazo. O prazo é o que há de mais conveniente para o interesse da população ” , disse Pires, justificando que a pressa pode levar a decisões inadequadas. O ministro classificou como ” um direito das oposições ” a tentativa de criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), na Câmara dos Deputados, para apurar as causas e conseqüências do apagão aéreo.
No discurso de despedida, o tenente-brigadeiro Luiz Carlos Bueno ignorou a crise e preferiu congratular-se pela reativação do Correio Aéreo Nacional, pela modernização de caças da FAB, pelo apoio aos soldados brasileiros no Haiti e no Timor Leste, e pela assistência a países asiáticos afetados por desastres naturais. Bueno, que comandou a Aeronáutica durante todo o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem sido cogitado para um cargo de observador militar nas Nações Unidas, para o qual teria de receber indicação do governo brasileiro.
A ascensão de Juniti Saito não é a única mudança na FAB, que deve passar por alterações importantes no primeiro escalão, durante os próximos meses. O brigadeiro William Barros deverá assumir o segundo cargo mais importante na Força, de chefe do Estado-Maior da Aeronáutica. O brigadeiro Aprígio Azevedo deverá ser um dos principais auxiliares de Saito, como seu chefe de gabinete. Ele esteve diretamente envolvido em dois dos processos mais ruidosos da Aeronáutica nos últimos anos: a compra de um novo avião presidencial e o Projeto FX.
Saito deu uma clara indicação de que pretende retomar as negociações para comprar um lote de modernos caças de combate para a FAB. ” Estamos atentos às novas aeronaves no mercado internacional e, tão logo seja possível, resgataremos o processo de aquisição de novos caças para a defesa de nosso território ” , afirmou o comandante. ” A Força Aérea Brasileira incorporou novas aeronaves ao seu acervo durante a gestão que hoje se encerra em um ritmo que há muito tempo não se via ” , disse ele em referência aos Mirage-2000C usados, que foram comprados da França, e à modernização dos caças F-5 pela Embraer. ” Cabe a mim dar continuidade a esse processo ” , concluiu.
Saito colocou ainda, como prioridade, a implantação de novas unidades da FAB na região amazônica. Nos próximos dias, tomam posse os novos comandantes do Exército, general Enzo Martins Peri, e da Marinha, almirante Júlio Soares Moura Neto.
Saito, que já esteve à frente de comandos aéreos regionais e foi o último chefe do Estado-Maior da Aeronáutica, tem 64 anos e nasceu em Pompéia, no interior paulista. É o primeiro de seis filhos de um casal de imigrantes japoneses. Como vivia em uma comunidade agrícola, só falava japonês até os sete anos. Gostava de engenharia e economia, mas descobriu a vocação militar quando estava no primeiro ano do curso técnico de contabilidade, em São Paulo. Ele viu um amigo de sua irmã usando o uniforme da Aeronáutica. Inscreveu-se e passou no concurso para a Escola Preparatória de Cadetes do Ar. Ontem, tornou-se o primeiro nissei a atingir o topo da carreira.
Fonte:
Valor Econômico
Daniel Rittner