Acionistas podem processar Petrobras por abuso de poder
09/01/2009
Caso a companhia absorva integralmente eventuais perdas decorrentes do aumento do gás natural, acionistas minoritários poderão acioná-la judicialmente
EXAME Se a queda-de-braço entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Sérgio Gabrielli, que comanda a Petrobras, for vencida por Lula e a estatal se vir obrigada a absorver o prejuízo causado pelo reajuste do gás boliviano, Lula colocará a petrolífera na linha de tiro dos acionistas minoritários. A vitória de Lula poderá detonar uma onda de ações judiciais contra a empresa. O motivo é simples: como controlador de uma companhia de capital aberto, o governo terá abusado de seu poder para obrigá-la a tomar uma atitude que contraria o interesse dos demais sócios.
Conhecido pelo perfil de negociador, construído ao longo de anos de atuação sindical, Lula dá sinais de que não quer se indispor nem fora nem dentro do Brasil. Para isso, aceitou renegociar o preço do gás fornecido pela Bolívia e garantiu aos consumidores — num recado direto às indústrias e distribuidoras — que o reajuste será absorvido internamente pela estatal. Na tentativa de apaziguar ânimos no vizinho sul-americano, Lula ainda desautorizou publicamente o presidente da Petrobras, que havia rejeitado a hipótese de aumento, e o contradisse, afirmando que a estatal continuará investindo no país, mesmo com a avaliação de Gabrielli de que a Bolívia tornou-se economicamente inviável.
Ao tomar essas decisões, Lula está desrespeitando a Lei 6.404/76, conhecida como Lei das Sociedades Anônimas. Em seu artigo 117, o texto afirma que o acionista controlador de qualquer empresa deve ser responsabilizado por danos decorrentes de abuso de poder. Entre os atos que caracterizam abuso de poder do controlador, o artigo cita: “orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional”.
“Lula está tratando esse assunto como se fosse algo dentro de sua própria casa. Ele dita as regras e acha que não deve satisfações a ninguém”, afirma o advogado Marcelo Constant Prais, sócio do escritório L.O. Batista. “Mas, como acionista controlador, o governo não pode obrigar a Petrobras a assumir os eventuais prejuízos do reajuste do gás”, diz Prais.
Em 31 de março, segundo o balanço da petrolífera, a União detinha 55,7% do capital votante da Petrobras, seguida pelos investidores estrangeiros que possuem 27,3% do capital, por meio de American Depositary Receipts de Nível 3 (ADRs – títulos brasileiros negociados no mercado americano). No capital total da companhia, a União participa com 32,2%, à frente dos detentores de ADRs (31,3%) e por pessoas físicas e jurídicas (17,9%). Os fundos de investimento que compraram ações com FGTS representam uma conta à parte, com 2,6% do capital.
Dessa forma, dizer que a Petrobras arcará com os prejuízos não significa dizer que o governo é quem os absorverá. “Os minoritários poderão reclamar judicialmente sobre eventuais prejuízos”, afirma Prais. O primeiro argumento que caracterizará o abuso de poder será a incoerência em relação ao que a empresa pratica em outros casos. Mesmo auto-suficiente na produção de petróleo, a direção da companhia já declarou que continuará acompanhando os preços internacionais e não descarta eventuais reajustes dos combustíveis, para não ser acusada de prejudicar os acionistas. Para Prais, ainda que a Petrobras retenha apenas uma parte do reajuste e repasse o restante para os consumidores, os minoritários poderiam reclamar.
Para o advogado, se Lula não quiser comprar uma briga com os demais sócios da estatal, a saída mais adequada será negociar duro com a Bolívia, rejeitando o reajuste, mas oferecendo eventuais contrapartidas, como convênios de crédito e linhas de financiamento para investimentos bolivianos, por exemplo. Em paralelo, a Petrobras deveria acionar as cortes internacionais para mediar o conflito causado pela nacionalização do setor petrolífero da Bolívia, país em que a estatal já investiu quase 1,5 bilhão de dólares.
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Exame