Indústria exporta 20% do que produz

09/01/2009

Estudos do BNDES e da Funcex indicam aumento expressivo da produção destinada ao exterior

As indústrias brasileiras exportaram, pela primeira vez, mais de 20% de sua produção em 2003. A expectativa é que devem repetir ou até melhorar a performance esse ano. Em relação a 1998, período pré-desvalorização cambial, os dados representam alta de 50% da participação das exportações na produção.

Ao longo destes seis anos, um processo de substituição de importações também ocorreu no país, mas não foi forte o suficiente para reduzir a participação das compras externas no consumo doméstico para níveis anteriores aos do início do Plano Real. Pelo contrário. Para 2004, a tendência é de novo aumento na participação das importações no consumo.

Por conta desse cenário, os economistas acreditam que o país está próximo de um “círculo virtuoso” com crescimento simultâneo dos coeficientes de exportação (total da produção destinada ao exterior) e importação (participação das compras externas no consumo aparente). Isso deve levar a um aumento do grau de abertura da economia, sem prejuízo para a balança comercial e, conseqüentemente, para as contas externas.

O coeficiente de exportação da indústria em geral, calculado pelos economistas Fernando Pimentel Puga e André Nassif, da área de planejamento do BNDES, ficou em 22,3% em 2003 e deve atingir o mesmo patamar esse ano. O indicador estava em 17,9% em 1996 e recuou para 14,7% em 1998. Na indústria de transformação ele atingiu 20% no ano passado.

Nas contas de Fernando Ribeiro, economista da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), o coeficiente de exportação da indústria atingiu 16% em 2003 e pode subir para 18% em 2004. Em 1996, o coeficiente ficou em 9,6% e, em 1998, 10,9%.

Os cálculos são feitos com metodologias semelhantes e ambos mostram aumento da produção doméstica destinada ao exterior. No entanto, o BNDES utiliza como base para o cálculo da produção a Pesquisa Industrial Anual (PIA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), enquanto a Funcex trabalha com as contas nacionais, também do IBGE.

“O período do câmbio fixo ficou para trás”, afirma Fernando Ribeiro, da Funcex. Ele destaca que o crescimento da participação das exportações na produção nacional atingiu as mais diversas áreas da economia. Dos 30 setores analisados pela Funcex, 28 registraram crescimento do coeficiente de exportação entre 1998 e 2003. “De alguma forma, todos se voltaram para a exportação”, completa Ribeiro.

Mas o aumento foi mais expressivo em algumas áreas. No setor automotivo, o coeficiente de exportação saltou de 22,7% em 1998 para 29,5% em 2003, segundo o estudo do BNDES. “Nesse caso, outros fatores também influenciaram, como o acordo comercial com o México e a reativação do comércio com a Argentina. Não foi apenas o câmbio”, diz Puga.

O trabalho do BNDES indica que alguns segmentos só agora se recuperaram dos estragos feitos pelo câmbio fixo em sua competitividade exportadora. No setor têxtil, o coeficiente de exportações era de 14% em 1996, recuou para 9,3% em 1998 e voltou para 17,2% em 2003. É o mesmo caso de calçados e artigos de couro, que oscilou de 49,4% em 1996 para 31,1% em 1998, voltando para 45,6% em 2003.

De forma geral, os coeficientes de exportação da indústria demoraram para se recuperar mesmo após a desvalorização e patinaram entre 16,3% em 2000 e 17,6% em 2002. Para Nassif e Puga, do BNDES, isso é natural. Logo após uma mudança cambial, há queda de preço da exportações, pois o importador pede desconto. Além disso, leva tempo para que maturem os investimentos voltados ao mercado externo e para que as linhas de crédito atendam à demanda.

Outro efeito importante efeito da desvalorização de 1999 foi provocar um processo de substituição de importações. Segundo o BNDES, a participação das importações no consumo doméstico caiu de 19,9% em 1996 para 17,3% em 1998 e ficou em 16,9% no ano passado. Os economistas do banco estimam um alta da participação para 17,4% este ano. Em veículos automotores, a substituição dos importados foi mais expressiva. O coeficiente saiu de 24,1% em 1998 para 15,2% em 2003.

Outros setores seguiram aumentando suas compras no exterior, apesar da desvalorização. É o caso de máquinas e aparelhos elétricos, que saiu de 25,7% em 1998 para 26,8% em 2003.

Na avaliação de Ribeiro, da Funcex, o processo de substituição de importações foi mais intenso nos bens destinados diretamente ao consumo do que nos bens intermediários. Ele explica que o peso dos insumos importados na produção caiu para 7% em 2003. Esse patamar, no entanto, está apenas 0,8 ponto percentual abaixo do pico, que foi registrado em 2001.

A alta do coeficiente de exportação com queda da utilização de insumos importados provocou expressivo aumento da abertura da indústria de transformação no Brasil. O coeficiente de abertura líquida calculado pela Funcex passou de 6,7% em 2002 para 8,4% em 2003.

Os economistas das duas instituições esperam que as importações e as compras de insumos importados aumentem em 2004 por conta do crescimento da economia. Ribeiro pondera que isso não é necessariamente ruim, porque as exportações também devem crescer. “O processo está começando. Correção cambial sozinha não faz milagre. É preciso crescimento”, diz Nassif, do BNDES.

Na avaliação de Ribeiro, é saudável que ocorra uma exposição maior da economia no mercado externo. Apesar do aumento expressivo do coeficiente de exportação nos últimos anos, o economista considera um patamar próximo a 20% baixo para padrões internacionais.

Valor Economico