Uma viagem pelos queijos italianos

14/06/2021

Masterclass evidencia a força da Itália neste segmento e a influência desses produtos no mercado brasileiro, além de promover um giro por tipos icônicos das 20 regiões

Há um ditado popular que garante a existência de uma igreja para cada dia do ano em Roma. Se levarmos esse tipo de conta para o mundo dos queijos, a Itália proporciona um giro pelo país de quase um ano e cinco meses sem repetir o formaggio nosso de cada dia. A ligação quase sagrada dos italianos com esse alimento não aparece somente em termos quantitativos. Dos cerca de 500 tipos de queijos existentes no país, responsáveis por uma produção anual de mais de 1,3 milhão de toneladas, 58 deles recebem selos de certificação da União Europeia: Denominação de Origem Protegida (DOP), Indicação Geográfica Protegida (IGP) ou Especialidade Tradicional Garantida (STG). O trio de denominações tutela padrões de qualidade e métodos de elaboração de produtos reconhecidos pelas suas singularidades. No que diz respeito aos queijos, a Itália lidera a lista de certificações na Europa, com três a mais do que a França.

O parmigiano-reggiano: um dos 58 queijos italianos com certificação da União Europeia (foto: Canva)

Foi esse cenário que marcou o ponto inicial da masterclass “Queijos Italianos – Da Sicilia ao Valle d’Aosta”, realizada no dia 9 de junho pela Câmara de Comércio Italiana de São Paulo (ITALCAM). O evento online integrou a programação 2021 do projeto internacional True Italian Taste, promovido e financiado pelo Ministero degli Affari Esteri e della Cooperazione Internazionale e executado pela Associazione delle Camere di Commercio Italiane all’Estero (Assocamerestero) em colaboração com a Italcam.

Três especialistas no tema participaram do webinar, aberto pelo presidente da ITALCAM, Graziano Messana: Gerardo Landulfo, delegado da Accademia Italiana della Cucina, Paola Tedeschi, professora de cultura gastronômica, e Paolo Bertholier, chef e degustador da Organizzazione Nazionale degli Assaggiatori di Formaggio (ONAF).

Landulfo, Tedeschi e Bertholier durante o evento (foto: Divulgação)

Depois de apresentar os dados que abrem esse texto, Landulfo frisou outro aspecto interessante. Em cada uma das 20 regiões italianas há, pelo menos, dez queijos registrados no Ministero delle politiche agricole, alimentari e forestali (MIPAAF) na lista dos “Prodotti Agroalimentari Tradizionali” (PAT). A denominação é um selo da Itália para produtos reconhecidos pela tradição e território de origem. “Trata-se do primeiro passo para outros queijos entrarem na lista de certificados pela União Europeia”, explicou Landulfo.

O mapa dos queijos italianos certificados (foto: slide da apresentação)

O delegado da Accademia Italiana della Cucina seguiu a conversa citando algumas passagens marcantes da história do queijo no planeta. Destacou a importância dos romanos na propagação do produto, a diversificação dos tipos na Itália medieval, a entrada nas mesas nobres durante o Renascimento e a propagação de queijos italianos mundo afora.

Representação da produção de queijo no livro medieval “Tacuinum sanitatis”, do século XIV (foto: Wikipédia)

“No Brasil, podemos dizer que a fase mais importante da produção de queijos começou com a imigração”, afirmou Paola Tedeschi. Seu pai, Cesare Giusti, mudou-se para o Brasil com a família a fim de ajudar na fundação e administração de uma filial da Polenghi no país, inaugurada em 1947 no interior paulista. “Quando chegamos por aqui, existiam apenas o queijo prato, o queijo do reino e uma mussarela estranha”, lembrou Paola. Segundo ela, seu pai aproveitou essa carência para introduzir outros tipos, como o provolone, o polenguinho, a ricota fresca e um similar ao bel paese lombardo.

Após citar outras marcas brasileiras importantes que se valeram de técnicas e maquinário italianos para produzir versões de queijos deste país europeu, como o tipo grana padano, da gaúcha RAR, e a mozzarella de búfala, da paulista Almeida Prado, Landulfo conduziu uma apetitosa viagem a queijos icônicos das 20 regiões da Itália, com comentários de Paolo Bertholier. O chef italiano, depois de explicar fatores que distinguiam os vários tipos de queijo, como a origem do leite, o fermento, a temperatura na produção e a maturação, forneceu detalhes e curiosidades em praticamente todas as paradas desse tour. Da origem do caciocavallo a uma boa receita de ravióli de abobrinha com o lombardo taleggio, passando pelas explicações dos nomes do calabrês musulupu e do abruzzese incanestrato, bem como o registro de que o casciotta di Urbino, de Marche, era o preferido do Papa Clemente XIV e de Michelangelo.

Nesse roteiro, Landulfo e Paola Tedeschi comentaram as versões nacionais mais comuns de queijos italianos, como a burrata, a ricota, o parmesão, o gorgonzola e o mascarpone. Ao falar do último, Paola lembrou da dificuldade em consumir queijos frescos italianos no Brasil, que não viajam bem. “Nesses casos, o melhor é fazer aqui”, opinou ela. Landulfo ressaltou a importância do cuidado com a terminologia correta na comercialização. “Um queijo canastra, por exemplo, não pode ser produzido com esse nome na Itália”, afirmou.

Casciotta di Urbino: o preferido de Michelangelo (foto: Divulgação)

O giro pelos queijos italianos, não por acaso, terminou no Valle d’Aosta. De lá, Paolo Bertholier degustou três queijos destacados da sua região natal – fontina, fromadzo e toma di Gressoney – e deu uma aula sobre eles. Ao falar do último, deixou evidente como um queijo italiano de boa qualidade pode nos transportar para sensações como as de “natureza” e “frescor”. “Quando você come esse queijo, há o gosto do leite e o bom cheiro do animal juntos”, filosofou ele, referindo-se ao odor agradável de uma vaca no campo.

Assista a masterclass completa no canal do Youtube da ITALCAM.