Lula sem plano B

09/01/2009

GESNER OLIVEIRA

Qual seria a plataforma econômica de um projeto de reeleição do presidente Lula depois do desgaste sofrido com a atual crise política? Alguns analistas ainda desconfiam de que poderia ser o famoso plano B do qual se falou tanto em 2003. Mas há boas razões para descartar uma guinada na política econômica promovida pelo próprio governo, por mais grave que se torne a crise política.

O plano B seria uma volta às origens do PT. Um retorno à noção de ruptura com o modelo econômico. Sua implementação acarretaria não apenas o fim do sistema de metas inflacionárias mas o próprio abandono da prioridade ao combate antiinflacionário e à austeridade fiscal. Em vez de redução significativa de gastos, conforme proposta recente de déficit nominal zero, haveria uma elevação da despesa pública como forma de estimular artificialmente a demanda da economia.

Alguns analistas argumentam que o plano B poderia sair da gaveta por duas razões. Em primeiro lugar, pelo maior peso da esquerda do PT depois dos expurgos de várias lideranças importantes do chamado Campo Majoritário do partido em razão dos escândalos recentes. Em segundo lugar, pela necessidade de oferecer algo mais atraente ao eleitor de 2006 do que meramente “mais do mesmo”. Esse segundo motivo seria especialmente importante diante do risco de crescimento de candidaturas à esquerda do PT ou com um discurso mais populista, como a de Garotinho.
É natural que um candidato procure apresentar algo novo. No caso de um postulante à reeleição, seriam esperáveis novas prioridades em seguimento àquilo que foi conquistado no primeiro mandato.

Em 1998, o então candidato à reeleição Fernando Henrique Cardoso prometia a geração de empregos depois de ter estabilizado os preços com o Plano Real. Qual seria a promessa do projeto de reeleição de Lula em 2006?
Não é fácil responder a essa pergunta. Mas é seguro que um plano B com as características descritas antes não atenderia aos quesitos de uma plataforma econômica de reeleição. Isso também se deve a duas razões. Em primeiro lugar, já foi difícil promover a guinada contida na “Carta ao Povo Brasileiro” em junho de 2002. Aquele era um momento de ascensão política e de aglomeração de forças no qual as chances de conquista do poder eram grandes.

Em segundo lugar, e mais importante, uma mudança brusca na política econômica na atualidade teria impacto imediato sobre os preços dos ativos financeiros. A mera sinalização de abandono das prioridades da política macro resultaria em elevação do prêmio de risco, volatilidade do dólar e queda das Bolsas, restringindo ainda mais o raio de manobra da política econômica.

Em 2002, quando o candidato Lula estava na oposição, era fácil fazer críticas contundentes à gestão econômica. Eventuais repercussões negativas no mercado teriam de ser administradas pela situação. O candidato à reeleição Lula não poderá fazer o mesmo em 2006. Os efeitos de declarações bombásticas de Lula B terão de ser resolvidas por Lula A. E Lula A já tem problemas suficientes para resolver.
As medidas anunciadas nesta semana parecem confirmar que o governo não pretende implementar um plano B. Embora tímida, a reforma ministerial resultou em equipe de perfil ligeiramente mais técnico. A decisão de reservar 70% dos cargos de confiança a servidores com concurso é positiva, embora ainda não haja plano articulado de implementação de tal meta.

A criação da Secretaria da Receita Federal do Brasil como resultado da fusão das secretarias da Receita Federal e da Receita Previdenciária também aponta na direção correta. Pode tornar mais eficiente o combate à sonegação e diminuir o custo que a duplicação de fiscalização impõe às empresas. Porém os principais desafios gerenciais, como o da integração entre os sistemas da Dataprev e do Serpro, ainda não foram enfrentados.

Tranqüiliza, portanto, o fato de o governo não ter um plano B em mente. Persiste, contudo, a inquietação pelo fato de não haver nenhum outro programa consistente que estimule o crescimento sustentado da economia.

Fonte:
Folha de S.Paulo
23/7/2005

Gesner Oliveira, 49, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
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